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ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL


MENSAGEM GABGOV/MS Nº 38, DE 16 DE JULHO DE 2012.

Veto Total: Altera e acrescenta dispositivos na Lei Estadual 2310, de 9 de outubro de 2001, que “Dispõe sobre a aplicação de penalidades à prática de assédio moral no âmbito da Administração Pública Estadual, e dá outras providências.”

Publicada no Diário Oficial nº 8.233, de 17 de julho de 2012, páginas 1 e 2.
OBS: Veto derrubado. Lei nº 4.384, de 16 de julho de 2013, promulgada pela Assembleia Legislativa.

Senhor Presidente,

Nos termos do § 1º do art. 70 e do inciso VIII do art. 89, ambos da Constituição Estadual, comunico a essa augusta Assembleia Legislativa, por intermédio de Vossa Excelência, que decidi vetar integralmente o projeto de lei que Altera e acrescenta dispositivos na Lei Estadual 2310, de 9 de outubro de 2001, que “Dispõe sobre a aplicação de penalidades à prática de assédio moral no âmbito da Administração Pública Estadual, e dá outras providências”, pelas razões que, respeitosamente, peço venia para expor:

RAZÕES DO VETO:

Pretendeu o nobre Deputado alterar e acrescentar dispositivos à Lei nº 2.310, de 9 de outubro de 2001, com o objetivo de aperfeiçoar o seu conteúdo.

Analisando o autógrafo do projeto de lei registro que, embora louvável, a proposição do Parlamentar ao dispor sobre a aplicação de penalidades à prática de assédio moral no âmbito da Administração Pública Estadual, interferiu em matéria de iniciativa da União, tendo em vista que nos termos do art. 22, inciso I, da Constituição Federal, compete privativamente à União legislar sobre direito do trabalho.

Frisa-se, ainda, que a intervenção do legislativo estadual nesse tema, por atribuir poder de fiscalização, no âmbito do trabalho, aos representantes legais dos órgãos, entidades, concessionárias ou permissionárias da Administração Estadual, também contraria a Carta Magna Federal, uma vez que, nos termos do seu art. 21, inciso XXIV, compete à União organizar, manter e executar a inspeção do trabalho.

O Supremo Tribunal Federal (STF) possui entendimento pacífico no sentido de que as normas locais que tenham como objeto matérias de competência legislativa privativa da União, especialmente, as que versem sobre direito do trabalho são eivadas de inconstitucionalidade formal, o que se infere dos seguintes Precedentes: ADI nº 601/RJ, Rel. Min, Ilmar Galvão, Pleno, unânime, DJ 20.9.2002; ADI nº 953/DF, Rel. Min. Ellen Gracie, Pleno, unânime, DJ 2.5.2003; ADI-MC nº 2.487/SC, Rel. Min. Moreira Alves, Pleno, unânime, DJ 1.8.2003; ADI nº 3.069/DF, Rel. Min. Ellen Gracie, Pleno, unânime, DJ 16.12.2005.

A Lei Federal nº 9.029, de 13 de abril de 1995, em seu art. 1º, veda a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeitos de acesso à relação de emprego ou à sua manutenção por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade. Nesse contexto, é importante reproduzir o texto do seu art. 4º, na redação dada pela Lei Federal nº 12.288, de 20 de julho de 2010, que prescreve:

“Art. 4º O rompimento da relação de trabalho por ato discriminatório, nos moldes desta Lei, além do direito à reparação pelo dano moral, faculta ao empregado optar entre:

I - a readmissão com ressarcimento integral de todo o período de afastamento, mediante pagamento das remunerações devidas, corrigidas monetariamente, acrescidas dos juros legais;

II - a percepção, em dobro, da remuneração do período de afastamento, corrigida monetariamente e acrescida dos juros legais.”

Analisando os dispositivos supracitados, verifica-se que embora não tratem, especificamente, sobre assédio moral, estes podem ser aplicados para coibir comportamento abusivo do empregador ou de seu preposto ou superior hierárquico, em relação ao trabalhador. Desse modo, tem-se que a proposta legislativa visa a disciplinar matéria que já encontra respaldo em legislação federal.

Outrossim, tramita na esfera federal, proposta de alteração do Código Penal, bem como outros projetos de lei que têm por objetivo prevenir e coibir o assédio moral e punir os assediadores. Nesse âmbito, destaca-se o projeto de lei nº 4.742/01, de autoria do Deputado Federal Marcos de Jesus que acrescenta ao Capítulo VI - Dos Crimes Contra à Liberdade Pessoal, do Código Penal, o art. 146-A, com a seguinte redação: “Desqualificar, reiteradamente, por meio de palavras, gestos ou atitudes, a auto-estima, a segurança ou a imagem do servidor público ou empregado em razão de vínculo hierárquico funcional ou laboral”. A pena fixada é de detenção de três meses a um ano, ou multa.

Contudo, o relator do projeto de lei nº 4.742/01, o Deputado Aldir Cabral, alterou o texto original por entender que a matéria deveria ser tratada no Capítulo III, Da Periclitação da Vida e da Saúde, logo após o crime de maus-tratos, sob o número 136-A, com a seguinte redação: "Depreciar, de qualquer forma e reiteradamente a imagem ou desempenho de servidor público ou empregado, em razão de subordinação hierárquica funcional ou laboral, sem justa causa, ou tratá-lo com rigor excessivo, colocando em risco ou afetando sua saúde física ou psíquica". A pena fixada é de detenção de dois meses a um ano, ou multa.

Disciplinando essa matéria, também está tramitando o projeto nº 080/2009, da autoria do Senador Inácio Arruda, que objetiva alterar o art. 27 da Lei Federal nº 8.666, de 1993, incluindo entre os requisitos necessários à habilitação da empresa participante do processo licitatório, a comprovação de inexistência de registros de condenação por prática de coação moral contra os seus empregados nos últimos cinco anos.

Embora o tema não seja novo e não exista legislação federal específica, é imperioso admitir que a matéria do projeto em comento é de competência da União, uma vez que versa sobre organização e fiscalização do trabalho, e também sobre a aplicação de sanção aos assediadores que é uma consequência da fiscalização que deve ser realizada pelos órgãos federais ou se configurará como delito penal, considerando o grau de reprovabilidade da infração. Nesta última hipótese a proposta legislativa seria formalmente inconstitucional, pois compete à União legislar sobre direito penal, art. 22, inciso I, da Constituição Federal.

Destarte, ao definir o que considera como assédio moral o projeto de lei estabelece relação entre a ação e a competência funcional, menciona atribuições, cria sistema de penalizações, normas procedimentais, e prevê despesas para o Poder Executivo. Além disso, a proposta em apreço cria obrigações e modifica a estrutura organizacional da Administração, em contrariedade ao princípio da harmonia e independência dos Poderes, art. 2º, caput, da Constituição Estadual.

O egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ/RS) julgou procedente a ADI proposta contra lei estadual que versava sobre assédio moral nos moldes pretendidos na presente proposta legislativa, nos seguintes termos:

ADin. LEI COMPLEMENTAR QUE PROÍBE O ASSÉDIO MORAL NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ESTADUAL DIRETA DE QUALQUER DE SEUS PODERES E INSTITUIÇÕES AUTÔNOMAS. Violação da garantia de iniciativa do Chefe do Poder Executivo em matéria atinente aos servidores públicos estaduais, seu regime e para o disciplinamento da estruturação e atribuições relativas aos órgãos da administração pública estadual. Inconstitucionalidade formal. Regramento que não fixa meras diretrizes ou princípios, mas definições concretas, estabelecendo direitos e sanções funcionais, interferindo na estrutura e organização administrativa, investindo no regime jurídico a que devem submeter-se os servidores públicos estaduais. AÇÃO JULGADA PROCEDENTE. (ADI 70017737511/2006. Órgão Especial. Des. Rel. Paulo Augusto Monte Lopes. Porto Alegre). No mesmo sentido: ADI 70028218865.

O projeto de lei em apreço, ao pretender veicular a instituição de medida administrativa impositiva, interferiu em matéria de iniciativa do Chefe do Poder Executivo concernente a servidores públicos, ao seu regime e ao estabelecimento de normas que disciplinem a estruturação e as atribuições relativas aos órgãos da Administração Pública do Estado, consoante dispõem o art. 67, § 1º, inciso II, alínea “d” e o art. 89, inciso V, da Constituição Estadual.

Convém repisar, que a proposição do parlamentar, sob a alegação de vedar o assédio moral no âmbito da Administração Pública, cria figuras típicas de infração administrativa, estabelece direitos e sanções funcionais, impõe deveres a órgãos da Administração Pública Estadual, interferindo na sua estrutura e organização, bem assim no regime jurídico a que devem submeter-se os servidores públicos estaduais.

Dessa forma, em virtude de o projeto em epígrafe imiscuir-se em matéria privativa da União, em clara ofensa ao art. 22, inciso I, da Constituição Federal e, também, por adentrar, inadvertidamente, na seara da iniciativa legiferante do Chefe do Poder Executivo, a quem cabe exercer a direção superior da administração, com o auxílio dos Secretários de Estado, a proposição em tela não pode ingressar no ordenamento jurídico de Mato Grosso do Sul.

À vista do exposto, com amparo nas manifestações da Procuradoria-Geral do Estado e da Secretaria de Estado de Administração, não me resta outra alternativa senão a de adotar a dura medida do veto total, contando com a compreensão e a imprescindível aquiescência dos Senhores Deputados para a sua manutenção.
                          Atenciosamente,

                          ANDRÉ PUCCINELLI
                          Governador do Estado
    A Sua Excelência o Senhor
    Deputado JERSON DOMINGOS
    Presidente da Assembleia Legislativa
    CAMPO GRANDE-MS