Senhor Presidente,
Nos termos do § 1º do art. 70 e do inciso VIII do art. 89, ambos da Constituição Estadual, comunico a essa augusta Assembleia Legislativa, por intermédio de Vossa Excelência, que decidi vetar, totalmente, o Projeto de Lei que estabelece que “Os veículos automotores apreendidos em razão da prática de ilícitos administrativos ou penais poderão ser utilizados pelo Poder Executivo”, pelas razões que, respeitosamente, peço vênia para expor:
RAZÕES DO VETO:
Pretendeu o ilustre Deputado Evander Vendramini estabelecer, em lei, que o Poder Executivo poderia utilizar os veículos automotores apreendidos em razão da prática de crimes ou ilícitos administrativos no Estado.
Sob o aspecto formal, infere-se que, ao pretender dispor sobre a utilização, pelo Poder Executivo, de veículos apreendidos por ilícitos penais e administrativos, no Estado de Mato Grosso do Sul, a proposta invade a esfera de competência da União Federal para legislar sobre processo penal e trânsito, cuja atribuição é privativa do ente central, nos termos do art. 22, incisos I e XI, da Constituição Federal.
Cumpre registrar que a União, no exercício da competência legislativa que lhe foi atribuída pelo texto constitucional, já disciplinou satisfatoriamente a matéria veiculada no aludido projeto de lei, por intermédio do Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997), traçando as regras atinentes à apreensão, remoção e restituição de veículos, bem como ao procedimento de leilão, nos moldes dos seus arts. 270, 271 e 328.
Dessa forma, o Código de Trânsito Brasileiro estabelece que o veículo apreendido ou removido a qualquer título e não reclamado por seu proprietário dentro do prazo de sessenta dias, contados da data de recolhimento, será avaliado e levado a leilão, a ser realizado preferencialmente por meio eletrônico (art. 328).
No mesmo sentido, a Resolução CONTRAN nº 623, de 6 de setembro de 2016, estabelece que, no caso de apreensão do veículo por ilícito administrativo, decorridos sessenta dias, o veículo poderá ser levado a leilão (art. 4º, § 6º). A mesma Resolução fixa providências preparatórias necessárias que antecedem a realização do leilão como, por exemplo, vistorias de identificação, avaliação e notificação (art. 7º).
No que se refere à utilização, pelo Estado, de veículo apreendido por ilícito penal, o Código de Processo Penal estabelece que, antes da decretação da perda do bem, o “juiz” poderá autorizar, constatado o interesse público, a utilização de bem sequestrado, apreendido ou sujeito a qualquer medida assecuratória pelos órgãos de segurança pública previstos no art. 144 da Constituição Federal, do sistema prisional, do sistema socioeducativo, da Força Nacional de Segurança Pública e do Instituto Geral de Perícia, para o desempenho de suas atividades (art. 133).
Por outro lado, ainda que se viesse a reconhecer a competência do Estado na implantação da medida anunciada na proposta, o que se aventa por hipótese, estaria o Parlamento a tratar de temas concernentes à fixação de políticas públicas e ao funcionamento da máquina administrativa, intervindo em “ato típico da Administração”, o que leva a que tal matéria fique reservada à competência exclusiva do Chefe do Poder Executivo, a quem cabe exercer a “direção superior da Administração Estadual”, com auxílio dos Secretários de Estado, na esteira do que rezam os citados arts. 67, § 1º, inciso II, alínea “d”, e 89, incisos V e IX, da Constituição Estadual.
Necessário observar que o projeto de lei em apreço, ao impor atribuições e medidas a serem adotadas pela Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública e pelo Departamento Estadual do Trânsito (art. 1º, §§ 2º e 3º), acaba por arrostar, data venia, a iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo para definir as diretrizes e dispor sobre o funcionamento da máquina estadual.
Ademais, a disposição contida no art. 2º do Projeto também deve ser tida por inconstitucional, porque o Executivo não pode ser compelido pelo Legislativo a exercer o seu poder regulamentar, por força do próprio texto constitucional (art. 89, VII, da CE), sob pena de ofensa ao princípio da harmonia e da separação dos Poderes (art. 2º, caput, da CE).
Não bastassem as inconstitucionalidades de natureza formal, a proposta legislativa também deve ser vetada por razões de natureza material.
De acordo com informações da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública, o Estado estabelece as condições mínimas para que veículos apreendidos sejam incorporados à frota do Estado, a fim de que se possa garantir, adequadamente, o abastecimento e a manutenção pelo sistema estadual, sendo condição essencial, dentre outras, o trânsito em julgado com a decretação do perdimento para o Poder Público, uma vez que, antes da decisão definitiva, há possibilidade do proprietário reaver seu bem e o Estado ter que ressarcir ou reparar o veículo para devolução nas condições em que foi apreendido.
Quanto do Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência (PROERD), a SEJUSP informa que já utiliza veículos destinados pelo Conselho Estadual de Políticas Públicas Sobre Drogas (CEAD-MS), realizando a gestão dos automóveis destinados aos leilões e aqueles cujo perdimento fora decretado para o Poder Público.
Por oportuno, convém salientar que projeto de lei semelhante a este foi objeto de veto, por meio da Mensagem nº 98, de 2 de dezembro de 2015, publicada no Diário Oficial nº 9.058, de 3 de dezembro de 2015.
Registra-se, portanto, que o Projeto de Lei em tela deve ser vetado, totalmente, por contrariar o art. 22, incisos I e XI, da Constituição Federal; arts. 2º, caput; 67, § 1º, inciso II, alínea “d”; 89, incisos V, VII e IX, todos da Constituição Estadual, bem como a legislação federal (Código de Processo Penal e Código de Trânsito Brasileiro).
Assim, não me resta outra alternativa senão adotar a rígida medida do veto total, contando com a compreensão e a imprescindível aquiescência dos Senhores Deputados para sua manutenção.
Atenciosamente,
REINALDO AZAMBUJA SILVA
Governador do Estado
A Sua Excelência o Senhor
Deputado PAULO JOSÉ ARAÚJO CORRÊA
Presidente da Assembleia Legislativa
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