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ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL


MENSAGEM GABGOV/MS Nº 100, DE 20 DE DEZEMBRO DE 2013.

Veto Total: Dispõe sobre o direito à continuidade no fornecimento de energia elétrica ao portador de doença ou patologia cujo tratamento ou procedimento médico requeira o uso continuado de aparelhos, e dá outras providências.

Publicada no Diário Oficial nº 8.582, de 23 de dezembro de 2013, páginas 4 e 5.

Senhor Presidente,

Nos termos do § 1º do art. 70 e do inciso VIII do art. 89, ambos da Constituição Estadual, comunico a essa augusta Assembleia Legislativa, por intermédio de Vossa Excelência, que decidi vetar totalmente o projeto de lei que Dispõe sobre o direito à continuidade no fornecimento de energia elétrica ao portador de doença ou patologia cujo tratamento ou procedimento médico requeira o uso continuado de aparelhos, e dá outras providências, pelas razões que, respeitosamente, peço vênia para passar a expor:
RAZÕES DO VETO:

Pretendeu a nobre Deputada, autora do projeto de lei, obrigar as concessionárias de energia elétrica do Estado a não interromper o fornecimento de energia elétrica à família de portador de doença ou patologia cujo tratamento ou procedimento médico requeira o uso continuado de aparelhos, equipamentos ou instrumentos, que, para o seu funcionamento demandem o consumo de energia elétrica, desde que a família cumpra todos os requisitos necessários à comprovação de tal condição perante a concessionária; e autorizar o Poder Executivo a conceder isenção do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual, intermunicipal e de comunicação (ICMS) à concessionária sobre o fornecimento de energia elétrica para a família do portador de doenças crônicas.

Analisando o aludido projeto de lei observa-se que não trata de produção e consumo, mas sim de criar uma obrigatoriedade a uma concessionária prestadora de serviço público de energia elétrica, cuja competência exclusiva é da União, para explorar diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão os serviços em tela, nos termos do art. 21, inciso XII, “b”, da Constituição Federal, o que exige o veto jurídico.

Nesse diapasão, não compete ao Parlamento Estadual traçar normas a serem observadas por prestadoras de serviços públicos de competência da União.

Por seu turno, é de bom alvitre registrar que a União exerce sua competência legislativa, no que tange à matéria em comento, por meio da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), consoante o art. 22, inciso IV da Constituição Federal, que é responsável pela regulação e fiscalização da prestação dos serviços, desde a geração até a comercialização.

Analisando a legislação federal acerca do tema, observa-se que já existem algumas leis que podem servir de mecanismo de proteção para os potenciais beneficiários da pretensa lei que ora se analisa, isto é, a Lei Federal nº 10.438, de 26 de abril de 2002, e a nº 12.212, de 20 de janeiro de 2010.
              Vale mencionar que a legislação federal em vigor contempla o benefício aqui tratado, conforme se depreende da Lei nº 12.212, de 2010, do Decreto nº 7.583, de 13 de outubro de 2011 e da Portaria Interministerial nº 630, de 8 de novembro de 2011, uma vez que ao dispor sobre Tarifa Social de Energia Elétrica, autoriza a inclusão nesse programa federal de família inscrita no CadÚnico e com renda mensal de até 3 (três) salários mínimos, que tenham entre seus membros portadores de doenças ou patologia cujo tratamento ou procedimento médico pertinentes requeira o uso continuado de aparelhos, equipamentos ou instrumentos que, para o seu funcionamento, demandem consumo de energia elétrica.

Além disso, a ANEEL, por sua vez, editou a Resolução nº 414, de 2010, que dispõe que o titular da unidade consumidora, devidamente cadastrada, onde residam usuários de equipamentos vitais à preservação da vida humana e dependentes de energia elétrica, deverão ser notificados da suspensão de fornecimento de forma escrita, com entrega comprovada.

Assim, verifica-se que no âmbito federal a matéria já está devidamente regulamentada, não podendo, in casu, o Estado legislar de forma a usurpar a competência da União e muito menos quebrar o equilíbrio econômico-financeiro da relação contratual existente entre ANEEL e as concessionarias de energia elétrica prestadoras do serviço público de energia no Estado.

Dessa forma, observa-se que quem detém competência para normatizar tal matéria já exerceu sua atribuição, não podendo o Poder Legislativo Estadual, no escopo de disciplinar a matéria em referência, usurpar competência da União.

Nesse sentido, convém recordar a seguinte decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que conclui pela invalidade de leis estaduais ou distritais que pretendiam introduzir nova regulamentação na prestação de serviços públicos federais, mutatis mutandis:
              Ação Direta de Inconstitucionalidade contra a expressão "energia elétrica", contida no caput do art. 1º da Lei nº 11.260/2002 do Estado de São Paulo, que proíbe o corte de energia elétrica, água e gás canalizado por falta de pagamento, sem prévia comunicação ao usuário. 2. Este Supremo Tribunal Federal possui firme entendimento no sentido da impossibilidade de interferência do Estado-membro nas relações jurídico-contratuais entre Poder concedente federal e as empresas concessionárias, especificamente no que tange a alterações das condições estipuladas em contrato de concessão de serviços públicos, sob regime federal, mediante a edição de leis estaduais. Precedentes. 3. Violação aos arts. 21, XII, b, 22, IV, e 175, caput e parágrafo único, incisos I, II e III da Constituição Federal. Inconstitucionalidade. 4. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada procedente. (STF, ADI 3729/SP, Rel. Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, j. 17/09/2007, DJ 09/11/2007, p. 29, RDDP 50/150-152); (grifos postos)

Nesse contexto, depreende-se da análise do texto do projeto de lei em epígrafe que os Parlamentares Estaduais, ao legislarem sobre a matéria em comento, extrapolam suas esferas de atuação, na medida em que pretendem obrigar as concessionárias de serviços de energia elétrica, localizadas no Estado de Mato Grosso do Sul, não interromperem o fornecimento de energia elétrica à família de portador de doença ou patologia cujo tratamento ou procedimento médico requeira o uso continuado de aparelhos, equipamentos ou instrumentos, que, para o seu funcionamento demandem o consumo de energia elétrica, invadem a competência privativa da União para disciplinar o assunto, e ainda interferem nas relações jurídicos contratuais já firmadas entre o Poder concedente federal e as empresas concessionárias do serviço público de energia elétrica.

Por outro lado, no que tange à autorização para o Estado conceder isenção de ICMS à concessionaria de energia elétrica sobre o fornecimento de energia elétrica para a família do portador de doenças crônicas, o procedimento para efetivação de normas que tratam de benefícios fiscais, após a definição pelo Poder Executivo das formas, necessitam ainda da aprovação do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ), e nos termos da Lei Complementar nº 24, de 7 de janeiro de 1975, mediante convênios celebrados e ratificados pelos Estados e pelo Distrito Federal, com a aprovação unânime dos Estado representados.

E, também, por se tratar de projeto de lei que dispõe sobre renúncia fiscal, a observância da Lei Complementar Federal nº 101, de 4 de maio de 2000, Lei de Responsabilidade Fiscal, que prevê a obrigatoriedade de toda proposição nesse sentido estar acompanhada da estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar a vigência do benefício e, nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a, pelo menos, uma das seguintes condições:
              “Art. 14. .......................................:

              I - demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma do art. 12, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias;

              II - estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado no caput, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

              ...................................................”

Destarte, vislumbra-se que a proposição em nenhum momento cumpriu o que determinam às leis que tratam dos requisitos necessários à tramitação de projetos de lei para concessão de benefício fiscal, não podendo, portanto, receber a chancela governamental.

Assim, em virtude das máculas jurídicas constatadas no projeto de lei em tela não pode a proposição ingressar no ordenamento jurídico do Estado.

À vista do exposto, com amparo nas manifestações da Procuradoria-Geral do Estado, da Agência Estadual de Regulação de Serviços Públicos de Mato Grosso do Sul e da Secretaria de Estado de Fazenda não me resta outra alternativa senão a de adotar a dura medida do veto total, contando com a compreensão e a imprescindível aquiescência dos Senhores Deputados para a sua manutenção.
Atenciosamente,

ANDRÉ PUCCINELLI
Governador do Estado

A Sua Excelência o Senhor
Deputado JERSON DOMINGOS
Presidente da Assembleia Legislativa
CAMPO GRANDE - MS