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ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL


MENSAGEM GABGOV/MS Nº 34, DE 29 DE JUNHO DE 2012.

Veto Total: Cria a “Cantina Saudável – Programa Viver Melhor – Prevenção e Tratamento da Obesidade Infantil” nas instituições de ensino públicas e privadas do Estado de Mato Grosso do Sul.

Publicada no Diário Oficial nº 8.222, de 2 de julho de 2012, páginas 1 e 2.

Senhor Presidente,

Nos termos do § 1º do art. 70 e do inciso VIII do art. 89, ambos da Constituição Estadual, comunico a essa augusta Assembleia Legislativa, por intermédio de Vossa Excelência, que decidi vetar integralmente o projeto de lei que Cria a “Cantina Saudável – Programa Viver Melhor – Prevenção e Tratamento da Obesidade Infantil” nas instituições de ensino públicas e privadas do Estado de Mato Grosso do Sul, pelas razões que, respeitosamente, peço venia para passar a expor:

RAZÕES DO VETO:

Pretendeu o ilustre Deputado, autor da proposta de lei, criar a “Cantina Saudável - Programa Viver Melhor - Prevenção e Tratamento da Obesidade Infantil” nas instituições de ensino públicas e privadas do Estado de Mato Grosso do Sul.

Avaliando o texto do projeto de lei, observa-se que a finalidade da proposta é louvável e o intuito do Parlamentar é nobre, sendo certo que esta administração comunga da preocupação com a obesidade infantil e com a sua prevenção. Entretanto, em virtude das máculas procedimentais, a proposta exige veto integral pelos motivos que se passará a expor.

Analisando detalhadamente o projeto de lei em epígrafe, verifica-se que embora o texto faça menção à criação da cantina saudável em nenhum momento dispõe-se acerca dessa cantina. Depreende-se, portanto, que se trata apenas da criação de um programa.

Nesse sentido, no que tange aos aspectos técnico, formal e normativo, observa-se que a proposição peca ao pretender criar um programa a ser desenvolvido por outros entes federados, ou seja, pelo Poder Executivo Estadual e Municipal, na medida em que abrange todas as instituições de ensino no Estado de Mato Grosso do Sul invadindo, assim, a competência legiferante destes entes.

No que diz respeito às escolas da rede pública estadual, constata-se que o texto em análise infringe o disposto no art. 67, § 1º, II, “d”, e no art. 89, V, da Carta Estadual, posto que elenca atribuições a serem desenvolvidas pelas escolas estaduais, isto é, a realização de exames com vistas a diagnosticar a presença de sobrepeso ou de indicativos de predisposição à obesidade, sendo tal determinação imprópria, uma vez que não pode o Parlamento Estadual iniciar processo legislativo acerca de atribuições de órgãos da administração pública do Estado. Esta competência é privativa do Chefe do Poder Executivo Estadual, o que torna a proposta padecedora de vício insanável, que não se convalida com a sanção e nem com a promulgação.

O Supremo Tribunal Federal já teve oportunidade de decidir que:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUICIONALIDADE. LEI ALAGOANA N. 6.153, DE 11 DE MAIO DE 2000, QUE CRIA O PROGRAMA DE LEITURA DE JORNAIS E PERIÓDICOS EM SALA DE AULA, A SER CUMPRIDO PELAS ESCOLAS DA REDE OFICIAL E PARTICULAR DO ESTADO DE ALAGOAS. 1. Iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo Estadual legislar sobre organização administrativa no âmbito do Estado. 2. Lei de iniciativa parlamentar que afronta o art. 61, § 1º, inc. II, alínea e, da Constituição da República, ao alterar a atribuição da Secretaria de Educação do Estado de Alagoas. Princípio da simetria federativa de competência. 3. Iniciativa louvável do legislador alagoano que não retira o vício formal de iniciativa legislativa. Precedentes. 4. Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente.” (STF. ADI 2329/AL, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, j. 14/04/2010, Dje-116 25/06/2010, Lex-STF 380/30, RT 900/143) (grifos postos)

Nesse contexto, insta salientar que a aprovação de leis ou introdução de normas que imponham ao Governador um dever relacionado à adoção de uma política pública ou de uma medida administrativa originariamente planejada pelo Parlamento, acaba por interferir em prerrogativas inerentes de Chefe da Administração, além de configurar ofensa ao princípio da harmonia e independência dos Poderes, elencado nos artigos 2os da Constituição Federal e da Estadual, e ainda em desrespeito ao princípio da reserva de administração, conforme já teve oportunidade de decidir o Supremo Tribunal Federal (STF)1.

Além das máculas constitucionais supracitadas, é forçoso reconhecer que a implantação desse programa trará despesas não previstas, pois todas as escolas estaduais deverão ter uma equipe multidisciplinar com profissionais da área de saúde, entre outros, o que provocará ingerência nas atribuições da Secretaria de Estado de Educação, bem como poderá ocasionar a desestruturação da programação orçamentária do Estado, em franca violação ao que dispõem o art. 160, incisos II e III, e o art. 165, inciso I, da Constituição do Estado.

Por outro lado, verifica-se que as imposições visam a atingir também instituições privadas de ensino, usurpando a competência privativa da União para legislar sobre a matéria, a teor do que dispõe o art. 22, XXIV, da Carta Magna.

Convém acrescentar ainda o entendimento do STF acerca da matéria em análise, qual seja:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI N. 11.830, DE 16 DE SETEMBRO DE 2002, DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, ADEQUAÇÃO DAS ATIVIDADES DO SERVIÇO PÚBLICO ESTADUAL E DOS ESTABELECIMENTOS DE ENSINO PÚBLICO E PRIVADOS AOS DIAS DE GUARDA DAS DIFERENTES RELIGIÕES E PROFESSADAS NO ESTADO. CONTRARIEDADE AOS ARTS. 22, XXIV; 61, § 1º, II, C; 84, VI, A; E 207 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. No que toca à administração pública estadual, o diploma impugnado padece de vício formal, uma vez que proposta por membros da Assembleia Legislativa gaúcha, não observando a iniciativa privativa do Chefe do Executivo, corolário do princípio da separação dos poderes. Já, ao estabelecer diretrizes para as entidades de ensino de primeiro e segundo graus, a lei atacada revela-se contrária ao poder de disposição do Governador do Estado, mediante decreto, sobre a organização e funcionamento de órgãos administrativos, no caso das escolas públicas; bem como, no caso das particulares, invade competência legislativa privativa da União. Por fim, em relação às universidades, a Lei Estadual n. 11.830/2002 viola a autonomia constitucionalmente garantida a tais organismos educacionais. Ação julgada procedente.” (STF, ADI 2806/RS, Rel. Min. ILMAR GALVÃO, Tribunal pleno, j. 23/04/2003, DJ 27/06/2003, p. 29, RTJ 1991/479). (grifos postos)

Não bastasse isso, a proposição legislativa, além de retirar a liberdade do administrador para organizar e gerir as atividades da empresa (escolas particulares) segundo as normas gerais estabelecidas na legislação federal de regência (Lei das Diretrizes e Base da Educação – LDB), poderá ainda ocasionar a desestruturação das suas finanças, porque a obriga a suportar gastos que não foram previamente previstos e que podem inviabilizar a continuidade das suas atividades, em franca violação ao princípio da preservação da empresa.

Portanto, em virtude das máculas jurídicas constatadas no projeto de lei em tela não pode a proposição ingressar no ordenamento jurídico do Estado.

À vista do exposto, com amparo nas manifestações da Procuradoria-Geral do Estado e da Secretaria de Estado de Educação, não me resta outra alternativa senão a de adotar a dura medida do veto total, contando com a compreensão e a imprescindível aquiescência dos Senhores Deputados para a sua manutenção.
                        Atenciosamente,

                        ANDRÉ PUCCINELLI
                        Governador do Estado

A Sua Excelência o Senhor
Deputado JERSON DOMINGOS
Presidente da Assembleia Legislativa
CAMPO GRANDE-MS
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1 STF, ADIn 2.808/RS, Rel. Min. GILMAR MENDES, Plenário, j. 24.08.2006, DJ 17.11.2006, p. 47, Lex-STF 338/46 e STF, ADIN-MC 1.144/RS, Rel. 1.144/RS, Rel. Min. FRANCISCO REZEK, Plenário, j. 23.02.1995, DJ 04.05.2001, p.2.