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ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL


MENSAGEM GABGOV/MS Nº 58, DE 7 DE AGOSTO DE 2014.

Veto Total: Dispõe sobre a concessão de incentivo financeiro aos catadores de materiais recicláveis - Bolsa Reciclagem.

Publicada no Diário Oficial nº 8.653, de 8 de abril de 2014, página 8.

Senhor Presidente,

Nos termos do § 1º do art. 70 e do inciso VIII do art. 89, ambos da Constituição Estadual, comunico a essa augusta Assembleia Legislativa, por intermédio de Vossa Excelência, que decidi vetar, totalmente, o projeto de lei que Dispõe sobre a concessão de incentivo financeiro aos catadores de materiais recicláveis - Bolsa Reciclagem, pelas razões que, respeitosamente, peço vênia para expor:
RAZÕES DO VETO:

Pretendeu o ilustre Deputado, autor do projeto de lei, conceder incentivo financeiro aos catadores de materiais recicláveis, sob denominação de Bolsa Reciclagem.

Analisando, pormenorizadamente, o texto em epígrafe aprovado pelos nobres Deputados, vislumbra-se que a proposição exige veto jurídico, uma vez que possui máculas formais que a fulminam no nascedouro.

Nesse sentido, vislumbra-se que a proposição legislativa, ao pretender criar a bolsa reciclagem e obrigar o Estado a conceder incentivo financeiro às cooperativas e às associações de catadores de material reciclável, usurpa as funções do Poder Legislativo e incursiona sobre “ato típico de Administração”, qual seja, a “direção superior da administração estadual, o que leva a que tal matéria fique reservada, sua iniciativa, à competência exclusiva do Chefe do Poder Executivo, na esteira do que determinam os arts. 67, § 1º, II, “d”, e 89, V, da Constituição Estadual.

Assim, a aprovação de leis ou a introdução de normas que imponham ao Chefe do Poder Executivo um dever relacionado à adoção de uma política pública ou de uma medida administrativa originariamente planejada pelo Parlamento, acaba por interferir em suas prerrogativas inerentes (e, portanto, inalienáveis, irrenunciáveis e intransferíveis) de Chefe da Administração e, termina por representar flagrante ofensa ao princípio da independência dos Poderes, insculpido no art. 2º da Constituição Estadual.

Em suma, pode-se afirmar que a instituição de qualquer programa de Governo no âmbito da Administração Pública está atrelada ao exercício de um juízo político (conveniência e oportunidade) inato ao Chefe do Poder Executivo, pelo que lhe cabe decidir “quais” as medidas e “como” e “quando” serão adotadas.

Ademais, impõe-se observar que a instituição do pretendido incentivo pecuniário concedido à cooperativa ou à associação de catadores de materiais recicláveis, de cujo montante a cota mínima de 90% será obrigatoriamente repassada/transferida aos catadores cooperados ou associados, representa a criação de um benefício da seguridade social, o que exige a indicação da respectiva fonte de custeio total, sob pena de afronta ao art. 195, § 5º, da Constituição Federal.

Nesse sentido, confira-se o precedente do Supremo Tribunal Federal (STF):

          Ação direta de inconstitucionalidade. Lei Estadual m. 2.120/99. Alegação de que a Lei Estadual violou os arts. 25 §§ 1º e 4º, 40 e 195, ‘caput’, § 5º, da CF, ao indicar ‘os filhos solteiros, com idade até 24 anos e frequência a cursos superiores ou técnicos de 2º grau como dependentes, para fins previdenciários, no Estado do Mato Grosso do Sul’. 2. O art. 195, da CF, na redação da EC n. 20/98, estipula que nenhum benefício ou serviço de seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total. A Lei n. 9.717/98 dispôs sobre regras gerais para a organização e funcionamento dos regimes próprios de previdência social dos servidores públicos da União, do Estado, do Distrito Federal e dos Municípios, dos militares dos Estados e do Distrito Federal, não poderão conceder benefícios distintos dos previstos no Regime Geral de Previdência Social, de que trata a Lei n. 8.213/91. 4. Extensão do benefício impugnada se fez sem qualquer previsão de correspondente fonte de custeio. A competência concorrente dos Estados em matéria previdenciária, não autoriza se desatendam os fundamentos básicos do sistema previdenciário, de origem constitucional. 5. Relevantes os fundamentos da inicial. Medida liminar deferida. (STF, ADI-MS 2.311/MS, Rel. Min. Néri da Silveira, Tribunal Pleno, J. 07.03.2002, DJ 07.06.2002, p.81)

E ainda:
          A jurisprudência do STF firmou-se, de modo unânime e uniforme, no sentido da autoaplicabilidade das normas inscritas no art. 201, §§ 5º e 6º, da CF. (...) A exigência inscrita no art. 195, § 5º, da Carta Política traduz comando que tem, por destinatário exclusivo, o próprio legislador ordinário, no que se refere a criação, majoração ou extensão de outros benefícios ou serviços da seguridade social. (STF, RE-AgR 151106, Rel. Min. Celso de Mello, 1ª Turma, j. 28.09.1993, DJ 26.11.1993).

Imperioso acrescentar que o Estado não pode simplesmente conceder incentivo financeiro sem obediência aos dispositivos contidos nas Constituições, bem como na Lei de Responsabilidade Fiscal, sem se sujeitar a punições severas resultantes da própria LRF como também da Lei de Improbidade Administrativa.

Assim, em virtude de todas essas máculas constatadas no projeto de lei em comento, não pode a proposição receber a chancela governamental.

À vista do exposto, com amparo na manifestação da Procuradoria-Geral do Estado, não me resta outra alternativa senão a de adotar a dura medida do veto total, contando com a compreensão e a imprescindível aquiescência dos Senhores Deputados para a sua manutenção.
                          Atenciosamente,

                          ANDRÉ PUCCINELLI
                          Governador do Estado

A Sua Excelência o Senhor
Deputado JERSON DOMINGOS
Presidente da Assembleia Legislativa
CAMPO GRANDE-MS