Senhor Presidente,
Nos termos do § 1º do art. 70 e do inciso VIII do art. 89, ambos da Constituição Estadual, comunico a essa augusta Assembleia Legislativa, por intermédio de Vossa Excelência, que decidi vetar integralmente o projeto de lei que Dispõe sobre a divulgação e informações dos órgãos de defesa e fiscalização de saúde aos usuários do sistema de saúde pública no âmbito do Estado de Mato Grosso do Sul e dá outras providências, pelas razões que, respeitosamente, peço venia para passar a expor:
RAZÕES DO VETO:
Pretendeu o nobre Deputado obrigar que os receituários médicos utilizados pela rede pública de saúde no Estado de Mato Grosso do Sul, contenham informações e orientações sobre os direitos dos usuários do Sistema Único de Saúde (SUS), com indicação no seu verso, dos contatos de todos os órgãos de defesa e fiscalização, isto é, telefones e correios eletrônicos das ouvidorias estadual e municipais de saúde e dos Ministérios Público Estadual e Federal.
Analisando o texto do projeto de lei, constata-se que o intuito do Parlamentar é louvável e a proposta é meritória.
No entanto, no que tange ao aspecto normativo, observa-se que a proposição, ao tentar obrigar que os receituários médicos utilizados pela rede pública de saúde no Estado contenham as informações e as orientações sobre os direitos dos usuários do SUS, atinge as três esferas de Governo, na medida em que as ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, descentralizado, com direção única em cada esfera de governo, nos termos do art. 198, inciso I da Constituição Federal.
Nessa esteira, a Lei Federal n. 8.080, de 19 de setembro de 1990, em seu art. 9º e incisos determinam que a direção do Sistema Único de Saúde (SUS) é única, de acordo com o inciso I do art. 198 da Constituição Federal, sendo exercida em cada esfera de governo pelos seguintes órgãos: no âmbito da União, pelo Ministério da Saúde; no âmbito dos Estados e do Distrito Federal, pela respectiva Secretaria de Saúde ou órgão equivalente; e no âmbito dos Municípios, pela respectiva Secretaria de Saúde ou órgão equivalente.
Nesse contexto, depreende-se da análise do texto do projeto de lei em epígrafe que os Parlamentares Estaduais, ao legislarem sobre a matéria em comento, extrapolam suas esferas de atuação, na medida em que traçam normas a serem cumpridas pelos outros Governos, ou seja, da União e dos Municípios, usurpando assim, a autonomia destes entes federados.
Por outro lado, caso não fosse essa usurpação de competência, ainda assim, a proposição estaria maculada, uma vez que, conforme se extrai dos dispositivos constitucionais e legais mencionados anteriormente, a direção do SUS na esfera estadual é exercida pela Secretaria de Estado de Saúde, que faz parte da estrutura do Poder Executivo Estadual. Depreende-se dessa constatação que não pode o Parlamento Estadual iniciar processo legislativo acerca de atribuições de órgãos da administração direta do Estado, conforme dispõem o art. 67, § 1º, II, “d”, e o art. 89, V, da Carta Estadual.
Insta salientar que a aprovação de leis ou introdução de normas que imponham ao Governador um dever relacionado à adoção de uma política pública ou de uma medida administrativa originariamente planejada pelo Parlamento acaba por interferir em prerrogativas inerentes de Chefe da Administração, além de configurar ofensa ao princípio da harmonia e independência dos Poderes, elencado nos artigos 2os da Constituição Federal e da Estadual, e ainda em desrespeito ao princípio da reserva de administração, conforme já teve oportunidade de decidir o Supremo Tribunal Federal (STF)1.
Por derradeiro, registro que a imposição contida no projeto de lei para que o Estado implemente a referida medida, além de representar indevida usurpação das atribuições do Chefe do Executivo, ainda incorre no vício de desestruturar a programação orçamentária do Estado, em franca violação ao que dispõe os arts. 160, II e III, e art. 165, I, da Carta Estadual.
Portanto, em virtude das máculas jurídicas constatadas no projeto de lei em tela não pode a proposição ingressar no ordenamento jurídico do Estado.
À vista do exposto, com amparo nas manifestações da Procuradoria-Geral do Estado e da Secretaria de Estado de Saúde, não me resta outra alternativa senão a de adotar a dura medida do veto total, contando com a compreensão e a imprescindível aquiescência dos Senhores Deputados para a sua manutenção.
Atenciosamente,
ANDRÉ PUCCINELLI
Governador do Estado
A Sua Excelência o Senhor
Deputado JERSON DOMINGOS
Presidente da Assembleia Legislativa
CAMPO GRANDE-MS
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1 STF, ADIn 2.808/RS, Rel. Min. GILMAR MENDES, Plenário, j. 24.08.2006, DJ 17.11.2006, p. 47, Lex-STF 338/46 e STF, ADIN-MC 1.144/RS, Rel. 1.144/RS, Rel. Min. FRANCISCO REZEK, Plenário, j. 23.02.1995, DJ 0 |