Senhor Presidente,
Nos termos do § 1º do art. 70 e do inciso VIII do art. 89, ambos da Constituição Estadual, comunico a essa augusta Assembleia Legislativa, por intermédio de Vossa Excelência, que decidi vetar, totalmente, o Projeto de Lei de autoria do Deputado Amarildo Cruz, que “cria no Estado de Mato Grosso do Sul o projeto “Sangue Bom”, visando a fomentar o cadastro de doadores de medula óssea e erradicar o problema de déficit de sangue nos hospitais e bancos de sangue para os atendimentos emergenciais, operações cirúrgicas e transplantes”, pelas razões que, respeitosamente, peço vênia para expor:
RAZÕES DO VETO:
O objetivo do presente Projeto é a erradicação do problema da falta de sangue nos hospitais e bancos de sangue para os atendimentos emergenciais, operações e transplantes, por meio de ações de conscientização promovidas pelos Poderes Públicos, sociedade civil e instituições privadas, devidamente associadas às ações dos hemocentros, na coleta de sangue e incentivos à doação e cadastro de doador de medula óssea.
Salienta-se que a proposta estabelece que “em todos os eventos esportivos e culturais no Estado de Mato Grosso do Sul, se separará um percentual de três a cinco por cento do total de ingressos, postos à venda, para doadores voluntários de sangue”. (sic)
Apesar do nobre propósito, o projeto de lei padece de vício de inconstitucionalidade formal e material.
O vício formal decorre do fato de que o projeto de lei, em apreço, usurpa competência privativa do Chefe do Poder Executivo.
A instituição de qualquer programa de governo constitui “ato típico de Administração”, o que leva a que tal matéria fique reservada à competência exclusiva do Chefe do Poder Executivo, a quem cabe exercer a “direção superior da Administração Estadual”, com o auxílio dos Secretários de Estado, conforme prescrevem os artigos 67, § 1º, II, “d”, e 89, V, da Constituição Estadual.
Nessa linha de raciocínio, insta salientar que a aprovação de leis ou a introdução de normas que imponham ao Governador um dever relacionado à adoção de uma política pública ou de uma medida administrativa, originariamente planejada pelo Parlamento, acaba por interferir em suas prerrogativas inerentes de Chefe da Administração e representa flagrante ofensa ao princípio da harmonia e independência dos Poderes, insculpido no artigo 2º, caput, da Constituição Estadual.
Com efeito, pode-se afirmar que a instituição de qualquer programa de Governo no âmbito da Administração Pública está atrelada ao exercício de um juízo político (conveniência e oportunidade) inato ao Chefe do Poder executivo, pelo que lhe cabe decidir “quais” medidas e “como” e “quando” serão adotadas.
Enfim, está evidente que as normas veiculadas no projeto de lei encontram-se eivadas de inconstitucionalidade formal, eis que pretendem instituir política pública estadual, de modo que há clara usurpação da competência privativa do Chefe do Poder Executivo.
Por derradeiro, o projeto de lei em apreço também padece de vício de inconstitucionalidade material ao estabelecer que, em todos os eventos esportivos e culturais no Estado de Mato Grosso do Sul, separar-se-á um percentual de três a cinco por cento do total de ingressos, postos à venda, para doadores voluntários de sangue (art. 2º), garantindo-lhes a gratuidade. Ressalta-se que isso viola o princípio constitucional da livre iniciativa e o do livre exercício de qualquer atividade econômica, conforme previsto nos arts. 1º, IV, e 170, caput, e parágrafo único da CF.
Ademais, a proposição, ao condicionar a gratuidade dos ingressos às doações de sangue (art. 3º, I), contraria ao art. 199, §4º da Constituição Federal, que veda a comercialização de sangue. Além disso, a Portaria nº 158/2016 do Ministério da Saúde, no art. 30, veda essa atitude, ao prescrever que “a doação de sangue deve ser voluntária, anônima e altruísta, não devendo o doador, de forma direta ou indireta, receber qualquer remuneração ou benefício em virtude da sua realização”.
À vista do exposto, com base na manifestação da Procuradoria-Geral do Estado, ressalta-se que a referida Proposta de Lei deve ser vetada, totalmente, por contrariedade aos artigos 67, § 1º, II, “d”, e 89, V, da Constituição Estadual, bem como artigos 1º, IV, e 170, caput e parágrafo único e art. 199, §4º da Constituição Federal.
Assim, não me resta alternativa senão a de adotar a dura medida do veto total, contando com a compreensão e a imprescindível aquiescência dos Senhores Deputados para sua manutenção.
Atenciosamente,
REINALDO AZAMBUJA SILVA
Governador do Estado
A Sua Excelência o Senhor
Deputado OSWALDO MOCHI JUNIOR
Presidente da Assembleia Legislativa
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