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ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL


MENSAGEM GABGOV/MS Nº 62, DE 13 DE SETEMBRO DE 2019.

Veto Total: Proíbe, no Estado de Mato Grosso do Sul, às instituições financeiras de ofertar ou celebrar qualquer tipo de contrato de operação de crédito com aposentados e pensionistas por meio de comunicação telefônica.

Publicada no Diário Oficial nº 9.987, de 16 de setembro de 2019, páginas 2 e 3.

Senhor Presidente,

Nos termos do § 1º do art. 70 e do inciso VIII do art. 89, ambos da Constituição Estadual, comunico a essa augusta Assembleia Legislativa, por intermédio de Vossa Excelência, que decidi vetar, totalmente, o Projeto de Lei que Proíbe, no Estado de Mato Grosso do Sul, às instituições financeiras de ofertar ou celebrar qualquer tipo de contrato de operação de crédito com aposentados e pensionistas por meio de comunicação telefônica, pelas razões que, respeitosamente, peço vênia para expor:

RAZÕES DO VETO:

Pretendeu o ilustre Deputado Evander Vendramini, autor do Projeto de Lei, proibir as instituições financeiras, seus representantes ou prepostos de ofertar ou celebrar com aposentados e pensionistas, por meio de comunicação telefônica, todo e qualquer tipo de contrato, serviços ou produtos na modalidade de consignação para desconto em suas aposentadorias, pensões, pecúlios, poupanças, contas correntes, tais como empréstimos, financiamentos, arrendamentos, hipotecas, seguros, aplicações financeiras, investimentos, ou qualquer outro tipo de operação que possua natureza de crédito. Embora o tema seja louvável, a proposição deverá ser vetada pelos motivos justificados a seguir.

Inicialmente, sob o ponto de vista estritamente formal, a Constituição Federal estabelece a competência concorrente da União, Estado e Distrito Federal legislar sobre consumo e responsabilidade por dano ao consumidor (art. 24, V e VIII, da CF/88), reservando à União a competência legislativa para dispor sobre normas gerais e aos demais entes federados a competência legislativa suplementar para editar normas específicas (art. 24, §§1º e 2º).

Dessa forma, em se tratando de proposições sobre temas afetos ao condomínio legislativo dos entes federados, a competência reservada aos Estados-membros é residual, encontrando-se adstrita à edição de regras de natureza específica, endereçadas ao tratamento de peculiaridades regionais, cabendo à União a atribuição de editar normas gerais.

A proposta legislativa tem por objeto proibir, no Estado de Mato Grosso do Sul, as instituições financeiras, seus representantes ou prepostos de ofertar ou celebrar com aposentados e pensionistas, por meio de comunicação telefônica, todo e qualquer tipo de contrato, serviços ou produtos, restando evidente que se trata de norma de caráter geral, eis que não se fundamenta em nenhuma particularidade local do Estado, sendo certo que a matéria veiculada merece disciplina uniforme em todo o território nacional, porquanto afeta indistintamente a todos entes políticos da Federação, incidindo, pois, a competência da União para fixar as normas gerais pertinentes (art. 24, §§ 1º e 2º, da Constituição Federal).

Registra-se que a União, no âmbito de sua competência, editou a Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa ao Consumidor) estabelecendo regras gerais acerca da proteção e defesa aos direitos do consumidor.

Dentre as regras de proteção ao consumidor, o Código de Defesa ao Consumidor estabelece como direitos básicos a “divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações”, bem como a “informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem (art. 6º, II e III), direitos estes que devem ser respeitados por todos os estabelecimentos comerciais no oferecimento de produtos ou serviços aos consumidores, sobretudo, as instituições financeiras, na oferta de contratos de empréstimos e financiamento, em todas as suas modalidades.

Assim, por mais ampla que seja a competência legislativa concorrente em matéria de defesa ao consumidor, a Carta Magna não autoriza os Estados a editarem normas acerca das relações contratuais que restrinjam as relações jurídicas entre particulares, uma vez que essa atribuição está inserida na competência privativa da União para legislar sobre Direito Civil e Comercial (art. 22, I).

Nesse particular aspecto, justifica-se a atribuição da competência do ente central, pois, por mais descentralizadas que sejam as federações, estas têm em comum o caráter nacional do mercado de consumo, não devendo existir barreiras internas à circulação de bens e serviços. Por essa razão, a regulamentação dos contratos entre particulares, mesmo nas relações de consumo, é confiada ao ente central, sendo a única entidade federativa com abrangência territorial para alcançar todo o mercado nacional.

Não bastassem os impedimentos de natureza formal, a proposta legislativa também deve ser vetada por razões de natureza material. Vejamos.

Sob o ângulo material, a proposta legislativa, ao proibir as instituições financeiras, seus representantes ou prepostos de ofertar ou celebrar com aposentados e pensionistas, por meio de comunicação telefônica, todo e qualquer tipo de contrato, serviços ou produtos, afronta o direito de propriedade, previsto no art. 5º, XXII, da Carta Magna, e os princípios da livre iniciativa e livre exercício de qualquer atividade econômica, garantido pelo art. 170, parágrafo único, da Constituição Federal.

Ademais, não obstante a intenção do Projeto de Lei seja a proteção dos consumidores aposentados e pensionistas, a proposta acaba por ser discriminatória ao considerar indistintamente que tais pessoas não possuem discernimento para avaliar a real necessidade e consequências de seus atos, afrontando o princípio da igualdade (art. 5 º, caput, CF), bem como o direito básico do consumidor de igualdade nas contratações (art. 6º, II, Lei nº 8.078/1990).

De igual modo, no que tange ao viés de proteção à pessoa idosa, a proposta se revela discriminatória, em afronta aos arts. 3º, inciso IV, e 5º, caput, da Constituição Federal bem como à Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003, (Estatuto do Idoso), que dispõe que nenhum idosos será objeto de qualquer tipo de qualquer tipo de negligência, discriminação, violência, crueldade ou opressão, e todo atentado aos seus direitos, por ação ou omissão, será punido na forma da lei (art. 4º).

Por fim, insta ressaltar que há muito idosos produtivos e atuantes, presentes no mercado de trabalho, pelo reconhecimento da plena capacidade e aptidão, em decorrência do aumento da expectativa de vida da população brasileira, fator que levou inclusive a revisão da idade mínima para aposentadoria.

Registra-se, portanto, que a Proposta de Lei em tela deve ser vetada, totalmente, por contrariar os arts. 3º, inciso IV; 5º, caput, inciso XXII; 22, inciso I; 24, incisos V e VIII e §§ 1º e 2º; e 170, parágrafo único, da Constituição Federal bem como as Leis nº 8.078/1990 e nº 10.741/2003.

À vista do exposto, não me resta alternativa senão a de adotar a rígida medida do veto total, contando com a compreensão e a imprescindível aquiescência dos Senhores Deputados para sua manutenção.

Atenciosamente,

REINALDO AZAMBUJA SILVA
Governador do Estado

A Sua Excelência o Senhor
Deputado PAULO JOSÉ ARAÚJO CORRÊA
Presidente da Assembleia Legislativa
CAMPO GRANDE-MS