Senhor Presidente,
Nos termos do § 1º do art. 70 e do inciso VIII do art. 89, ambos da Constituição Estadual, comunico a essa augusta Assembleia Legislativa, por intermédio de Vossa Excelência, que decidi vetar integralmente o projeto de lei que Institui o Serviço Voluntário Ambiental no âmbito do Estado de Mato Grosso do Sul, pelas razões que, respeitosamente, peço venia para passar a expor:
RAZÕES DO VETO:
Pretendeu o nobre Deputado instituir o Serviço Voluntário Ambiental no território do Estado de Mato Grosso do Sul.
Analisando o texto do projeto de lei, constata-se que o intuito do Parlamentar é louvável e a proposta é meritória.
No entanto, no que tange ao aspecto normativo, observa-se que a proposição está eivada de vícios que maculam na integra a proposta em comento, na medida em que afronta o art. 21, inciso XXIV e o art. 22, inciso I, da Constituição Federal, visto que dispõe sobre direito do trabalho e, ainda, poder de fiscalização, no âmbito do trabalho, a ente da Federação que não a União.
Nesse sentido, relevante trazer à baila que, com a promulgação da Emenda Constitucional nº 45, de 2004, houve significativa ampliação da competência da Justiça do Trabalho, na medida em que ela passou a processar e julgar as ações oriundas não apenas da relação de emprego, mas também da relação de trabalho, nos termos do art. 114, inciso I da Constituição Federal.
Assim, atualmente, a Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar quaisquer ações que envolvam relação de trabalho lato sensu seja de emprego ou não.
Os litígios advindos da relação de trabalho voluntário passam a se sujeitar à competência da Justiça do Trabalho. Desse modo, carece competência ao Poder Legislativo Estadual para disciplinar sobre serviço voluntário, por estar tal matéria inserida no âmbito da competência da União para legislar sobre direito do trabalho.
A União, exercendo sua competência legislativa, editou a Lei Federal nº 9.608, de 18 de fevereiro de 1998, que Dispõe sobre o serviço voluntário e dá outras providências, disciplinando as condições para caracterização da prestação de serviço voluntário, no intuito de evitar o seu desvirtuamento. Nem poderia ser diferente, uma vez que compete à União executar a inspeção do trabalho.
A sobredita Lei Federal prescreve em seu art. 1º, caput, que se considera serviço voluntário, a atividade não remunerada, prestada por pessoa física à entidade pública de qualquer natureza, ou a instituições privada de fins não lucrativos, que tenha objetivos cívicos, culturais, educacionais, científicos, recreativos ou de assistência social, inclusive mutualidade.
Dessa forma, qualquer relação jurídica que não se amolde aos requisitos caracterizadores do trabalho voluntário deve ser enquadrada como relação empregatícia pela Justiça do Trabalho.
Nesse sentido, colhe-se o seguinte precedente: TRABALHO VOLUNTÁRIO. DESVIRTUAMENTO. VÍNCULO EMPREGATÍCIO. CARACTERIZAÇÃO. A contraprestação em pecúnia desnatura o trabalho voluntário de que trata a Lei nº 9.608/98, possibilitando o reconhecimento do vínculo empregatício. (TRT 10ª Região. Processo 00265-2007.018-10-00-6. 1ª Turma. Julg. 18/07/2007. Publ. 27/07/2007).
Destarte, denota-se que o disciplinamento da relação de trabalho é de suma importância para a seara do direito do trabalho, já que eventual desvirtuamento do trabalho voluntário desnatura a relação de trabalho fazendo surgir relação de emprego. Desse modo, forçoso reconhecer que, mesmo antes da EC nº 45/2004, a regulamentação do serviço voluntário somente poderia ser feita pela União a quem compete legislar sobre o direito do trabalho e executar a inspeção do trabalho.
Nesse contexto, imperioso reconhecer que os Parlamentares Estaduais, ao legislarem sobre a matéria em comento, extrapolam suas esferas de atuação e invadem a competência privativa da União para disciplinar o assunto.
Oportuno registrar que tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 3058/2011, que pretende alterar a Lei Federal nº 9.608, de 1998, para incluir como serviço voluntário, dentre outras atividades, a que tenha por objetivo “a defesa e proteção do meio ambiente”.
Não bastassem os mencionados vícios, a proposição também usurpa competência privativa do Chefe do Poder Executivo Estadual, na medida em que cria funções na Administração Pública ao instituir o citado serviço voluntário, desrespeitando o art. 2º, caput; o art. 67, § 1º, inciso II “a” e “d”; e o art. 89, inciso V, da Constituição Estadual.
Portanto, em virtude das máculas jurídicas constatadas no projeto de lei em tela, não pode a proposição ingressar no ordenamento jurídico do Estado.
À vista do exposto, com amparo na manifestação da Procuradoria-Geral do Estado, não me resta outra alternativa senão a de adotar a dura medida do veto total, contando com a compreensão e a imprescindível aquiescência dos Senhores Deputados para a sua manutenção.
Atenciosamente,
ANDRÉ PUCCINELLI
Governador do Estado
A Sua Excelência o Senhor
Deputado JERSON DOMINGOS
Presidente da Assembleia Legislativa
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