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ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL


MENSAGEM GABGOV/MS Nº 77, DE 2 DE SETEMBRO DE 2014.

Veto Total: Estadualiza a estrada vicinal denominada Estrada da Balsinha, que atende aos municípios de Naviraí, Itaquiraí e Iguatemi em uma extensão de aproximadamente 40 (quarenta) Km.

Publicada no Diário Oficial nº 8.749, de 3 de setembro de 2014, páginas 2 e 3.
OBS: Veto total rejeitado - Lei nº 4.616, de 22 de dezembro de 2014, promulgada pela Assembleia Legislativa.

Senhor Presidente,

Nos termos do § 1º do art. 70 e do inciso VIII do art. 89, ambos da Constituição Estadual, comunico a essa augusta Assembleia Legislativa, por intermédio de Vossa Excelência, que decidi vetar integralmente o projeto de lei que Estadualiza a estrada vicinal denominada Estrada da Balsinha, que atende aos municípios de Naviraí, Itaquiraí e Iguatemi em uma extensão de aproximadamente 40 (quarenta) Km, pelas razões que, respeitosamente, peço venia para passar a expor:

RAZÕES DO VETO:

Pretenderam os ilustres Deputados, autores do projeto de lei em epígrafe, transferir para a responsabilidade do Governo do Estado de Mato Grosso do Sul a estrada vicinal, denominada “Estrada da Balsinha”, naquela região que envolve os Municípios de Naviraí, Itaquiraí e de Iguatemi.

Antes de passar à análise técnico-jurídica da proposta de lei, é imperioso ponderar que a estadualização pretendida pelos Parlamentares implica assumir a manutenção, bem como a legalização e a demarcação de toda faixa de domínio, que nas rodovias estaduais é de 40 (quarenta) metros, gerando custos não previstos, inclusive, na lei orçamentária.

Outro aspecto a ser pontuado é que, embora a Lei do Município de Iguatemi nº 1.716/2013 autorize a transferência da mencionada estrada, em uma extensão de 17 (dezessete) Km, para o Estado e delegue à Agência Estadual de Gestão de Empreendimentos (AGESUL) competência para os atos administrativos necessários à efetivação do controle e da manutenção da estrada, entre outras atribuições, tal procedimento não pode ser disposto da forma como colocado, na medida em que, antes, necessário se faz estabelecer tratativas com o Chefe do Poder Executivo Estadual acerca do assunto, até mesmo pelo fato de envolver dispêndio de recursos não expressamente previstos no orçamento do Estado.

Com relação aos outros municípios envolvidos não consta no processo legislativo comprovação de lei similar, mas, ainda que houvesse juntado, o vício de iniciativa persiste.

Além disso, no tocante ao aspecto jurídico, o ente Municipal e o Parlamento Estadual não podem, mesmo que por meio de lei, impor ao Estado a responsabilidade pela referida estrada vicinal, sob pena dessa lei ser declarada inconstitucional, por ferir a autonomia do ente estatal e a independência e a harmonia entre os poderes, nos termos do art. 18, caput e do art. 2º da Constituição Federal.

Por outro norte, o autógrafo do projeto de lei aprovado pelos doutos Deputados Estaduais exige o veto total, ainda, porquanto o texto do ato sub examine afronta diretamente o inciso I do art. 30 da Constituição Federal, o art. 157 da Constituição Estadual, fere as normas contidas nos arts. 15, 16 e 17 da Lei Complementar Federal nº 101, de 4 de maio de 2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal), conforme ao final restará satisfatoriamente demonstrado.

Por tratar-se de matéria de interesse local, não poderia o Estado estadualizar a referida estrada, uma vez que os Municípios possuem autonomia para administrar e gerir despesas necessárias para manutenção e conservação da aludida estrada, com intuito de impulsionar a atividade econômica da região.

O art. 18 da Carta Magna estabelece a organização político-administrativa da República Federativa do Brasil que compreende a União, o Estado, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos.

Logo, convém destacar que os municípios possuem autonomia para dispor sobre a composição de seu governo e de sua administração, já que podem legislar sobre assunto de interesse local, na forma do inciso I do art. 30 da Constituição Federal.

Destaca-se, ainda, que as estradas são bens públicos, o que é indubitável; pertencem a categoria das chamadas estradas vicinais, citadas com propriedade por Hely Lopes Meirelles1, que assim leciona:
          “As estradas vicinais, assim entendidas as vias de comunicação da cidade e vilas com zona rural, são de alçada exclusiva do Município. A abertura e conservação dessas estradas constitui um dos serviços mais custosos para a Municipalidade, quer pelos problemas técnicos que apresenta, quer pela mecanização que exige, quer pelas despesas que acarreta ao erário Municipal.”

Assim, conclui-se que o projeto peca no seu nascedouro, sendo formalmente inconstitucional, na medida em que agride o disposto no art. 18 e no inciso I do art. 30 da Carta Magna, uma vez que trata de interesse visivelmente local, sendo, portanto, competência do município sua gestão, em razão de sua autonomia.

No âmbito estadual, temos a Lei nº 27, de 19 de novembro de 1979, que “Aprova o Sistema Rodoviário do Estado de Mato Grosso do Sul”, que em seu art. 1º dispõe:
          “Art. 1º Fica aprovado o Sistema Rodoviário do Estado de Mato Grosso do Sul constituído das rodovias que integram a relação descritiva contida no Anexo I desta Lei. (grifo nosso).

Logo, as rodovias da alçada de competência do Estado são somente aquelas listadas no Anexo I da Lei Estadual nº 27, de 19 de novembro de 1979. Ressalte-se, entretanto, que a relação constante do Anexo I não é estática, conforme se vê do art. 3º, do mesmo diploma legal, que assim assevera:
          “Art. 3º O Sistema Rodoviário do Estado, aprovado por esta lei, será revisto periodicamente com base em estudos globais e planos diretores de desenvolvimento, visando a sua compatibilização com os interesses econômico-sociais do Estado e com a Política Nacional de Viação.” (grifo nosso).

Dessa forma, considerando os dispositivos legais regedores da matéria, haveria a possibilidade de o Estado, no trabalho de revisão de seu Sistema Rodoviário, incorporar a rodovia em questão, visando à sua compatibilização com os interesses econômico-sociais em destaque, estudo esse a ser feito pelos órgãos técnicos competentes.

De outro vértice, ressalta-se que o Estado já direciona recursos para a recuperação de estradas municipais, consoante a repartição tributária relativa ao Fundo de Desenvolvimento do Sistema Rodoviário do Estado de Mato Grosso do Sul (FUNDERSUL).

Vislumbra-se, ainda, que tal medida reclama recursos financeiros para a sua efetivação, porquanto será necessário realizar manutenção e conservação da referida estrada.

Nessa mesma esteira, vale observar que se tal projeto fosse sancionado acarretaria um aumento excessivo das despesas do Estado, em razão do custo elevado não apenas para manutenção e conservação e realização de obras nesse trecho, mas principalmente, para a desapropriação da faixa de domínio.

Outrossim, prescreve o caput do art. 15 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, que serão consideradas não autorizadas, irregulares e lesivas ao patrimônio público as despesas públicas geradas sem que tenha sido realizada uma estimativa do impacto orçamentário que a obrigação causará aos cofres do Estado.

A Lei de Responsabilidade Fiscal, em seu art. 16, prescreve que a medida que acarrete aumento de despesa será acompanhada de: (I) estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subsequentes; e (II) declaração do ordenador da despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias. Por seu turno, o art. 17 da mesma lei complementar dispõe que o ato que crie ou aumente despesa obrigatória de caráter continuado, além de ser instruído com a estimativa de que trata o inciso I do art. 16, deverá demonstrar a origem dos recursos para seu custeio, bem como comprovar que a despesa criada ou aumentada não afetará as metas fiscais da lei de diretrizes orçamentárias.

Contudo, conforme se depreende da análise do projeto de lei, não houve, em nenhum dos dispositivos, a previsão de estimativa de impacto orçamentário-financeiro da medida, nem a declaração do ordenador de despesa quanto à adequação da despesa com a lei orçamentária anual.

Pelo fato de o projeto ser contrário à Constituição Federal e à Estadual e não guardar correspondência com a Lei de Responsabilidade Fiscal, uma vez que a criação dessa obrigatoriedade está condicionada à obediência dos requisitos expostos na legislação infraconstitucional, o que não ocorreu no caso em tela, não pode tal proposição receber a sanção do Chefe do Poder Executivo.

Por derradeiro, embora demonstrada as máculas presentes no projeto de lei em epígrafe, é imperioso consignar, que a mencionada estrada corresponde à Estrada Planejada MS-290, que liga o Munícipio de Naviraí até a MS-180 que está sendo pavimentada por este Governo do Estado, sendo que já fora, inclusive construída a ponte de concreto sobre o Rio Amambai nessa Gestão.

Dessa forma, mesmo não sendo de responsabilidade do Poder Executivo Estadual, as sobreditas obras já foram ou estão sendo realizadas, exceto a faixa de domínio de 40 metros, mas de forma discricionária e não compulsória e impositiva, conforme pretende estabelecer o Poder Legislativo Estadual, nessa oportunidade.

À vista do exposto, com amparo na manifestação da Procuradoria-Geral do Estado não me resta outra alternativa senão a de adotar a dura medida do veto total, contando com a compreensão e a imprescindível aquiescência dos Senhores Deputados para sua manutenção.
                      Atenciosamente,

                      ANDRÉ PUCCINELLI
                      Governador do Estado

A Sua Excelência o Senhor
Deputado JERSON DOMINGOS
Presidente da Assembleia Legislativa
CAMPO GRANDE-MS
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1 Meirelles, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. 13ª ed. Atual... São Paulo: Malheiros, Ltda. P. 430.