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ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL


MENSAGEM GABGOV/MS Nº 50, DE 3 DE DEZEMBRO DE 2010.

Veto Total: Proíbe a cobrança de ICMS nas contas de serviços públicos de água, luz e telefone, de igrejas e templos de qualquer crença no Estado de Mato Grosso do Sul.

Publicada no Diário Oficial nº 7.840, de 6 de dezembro de 2010.

Senhor Presidente,

Nos termos do § 1º do art. 70 e do inciso VIII do art. 89, ambos da Constituição Estadual, comunico a essa augusta Assembleia Legislativa, por intermédio de Vossa Excelência, que decidi vetar, totalmente, o projeto de lei que Proíbe a cobrança de ICMS nas contas de serviços públicos de água, luz e telefone, de igrejas e templos de qualquer crença no Estado de Mato Grosso do Sul, pelas razões que, respeitosamente, peço vênia para expor:

RAZÕES DO VETO:

Analisando o autógrafo do projeto de lei, inicialmente, é importante esclarecer que o seu texto não trata de imunidade para templos religiosos, consagrado no art. 150, inciso VI, alínea “b”, da Constituição Federal, mas sim de isenção. É importante esclarecer que nos termos do § 4º do referido dispositivo constitucional a imunidade nele prevista, alcança apenas o patrimônio, a renda e os serviços relacionados com as finalidades essenciais dos templos de qualquer culto, aplicando-se somente quando essas instituições forem contribuintes de direito.

No caso em tela, busca-se afastar da incidência tributária hipótese em que os templos são contribuintes de fato, não alcançados pela regra de imunidade tributária estabelecida na Constituição Federal, concedendo-se a eles isenção. Sobre esse assunto reproduzo a doutrina de Eduardo Sabbag que resume o posicionamento do Supremo Tribunal Federal, ratificando o entendimento ora esposado:
          “A bem da verdade, a discussão que é bem antiga, foi pacificada com a prevalência do entendimento do então Ministro do STF, Bilac Pinto, que relatou célebre acórdão (RE n. 68.741/SP, em 1970), entendendo que a figura do contribuinte de fato era estranha à relação tributária, não podendo alegar, a seu favor, a imunidade tributária. [...]

          Como é sabido, o entendimento de Bilac Pinto mudou a jurisprudência do STF, que começou, deste então, a adotar tal postura, ou seja, admitir a incidência dos impostos indiretos nas compras de bens por entidades políticas imunes. [...]”

Nesse contexto, registro que em se tratando de isenção de ICMS incidente sobre os serviços de água, luz e telefone aos templos religiosos, contribuintes de fato, a iniciativa de lei é privativa do Poder Executivo, a quem compete, nos termos do art. 165, caput e § 6º da Constituição Federal, dispor com exclusividade sobre a matéria, pois se refere à renúncia fiscal, o que repercute diretamente no orçamento público.

Acerca do tema são pertinentes as reflexões de Regis Fernando de Oliveira, extraídas da publicação, Curso de direito financeiro, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2006, pág. 417, in verbis:
          “Quem pode isentar? Pode o integrante do Poder Legislativo propor isenção ou cabe a iniciativa apenas ao Chefe do Poder Executivo? Observe-se que a isenção não é matéria tributária. Constitui-se parte do planejamento financeiro de um ente. Logo, o poder de iniciativa pertence exclusivamente ao Chefe do Executivo.”
Esse também é o posicionamento encontrado nas lições do Mestre Roque Antônio Carrazza e na jurisprudência não é diferente:
          “Inconstitucionalidade. Ação Direta. Lei Municipal nº 1.747/08 e Lei Complementar Municipal nº 14/08, ambas de Jandira, as quais respectivamente, alteraram dispositivos das Leis nº 1.042/96 e 1.426/06, concedendo isenção tributária de IPTU a entidades religiosas e Beneficentes, quando imóvel é locado. Normas de iniciativa parlamentar. Matéria tributária. Leis tributárias benéficas. Diminuição da receita do Município. Atribuição exclusiva do Prefeito. Ofensa ao princípio da separação de poderes. Ação procedente.” (TJSP, ADI nº 994092209699 (1790510400), rel. Des. Penteado Navarro, j. 11/11/09). (destacamos).

Além disso, a União no exercício da competência para dispor sobre finanças públicas, conferida pelo o art. 24, inciso I e § 1º em harmonia com o art. 163, inciso I, da Constituição Federal, editou a Lei Complementar Federal nº 101, de 4 de maio de 2000, de âmbito nacional e observância obrigatória pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios (art. 1º, § 2º), e ao disciplinar sobre a renúncia de receita, incluindo a concessão e a anistia, definiu que, verbis:
          “Art. 14. A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a pelo menos uma das seguintes condições:

          I - demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma do art. 12, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias;

          II - estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado no caput, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

          § 1º A renúncia compreende anistia, remissão, subsídio, crédito presumido, concessão de isenção em caráter não geral, alteração de alíquota ou modificação de base de cálculo que implique redução discriminada de tributos ou contribuições, e outros benefícios que correspondam a tratamento diferenciado. (destaquei).

          .......................”

Por outro lado, cumpre esclarecer que dos tributos de competência estadual apenas o Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) e o Imposto sobre a Transmissão "Causa Mortis" e Doação de quaisquer bens ou direitos (ITCD), por incidirem sobre bens patrimoniais, se enquadram no conceito de imposto sobre o patrimônio, portanto alcançam imunidade desde que os bens estejam vinculados às finalidades essenciais das entidades religiosas.

No entanto, o ICMS não grava patrimônio e renda, porquanto incide apenas sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, logo, é um imposto indireto, chamado de imposto cobrado por dentro, ou seja, seu valor é parte integrante do preço da mercadoria ou do serviço, cujo ônus é suportado pelo consumidor final.

Dessa forma, o ICMS destacado nas notas fiscais de energia elétrica, de fornecimento de água e de serviços de telecomunicação, surge de uma relação jurídica entre o Estado e as empresas concessionárias, que dá ensejo à ocorrência do fato gerador do imposto. Dessa forma as concessionárias respondem pelo recolhimento do imposto ao fisco, sendo nessa condição, o contribuinte de direito.

As igrejas e os templos de qualquer culto apenas sofrem, indiretamente, o ônus do imposto, na condição de “contribuinte de fato”, pois o encargo do imposto a eles transferidos por meio do preço da mercadoria e do serviço não tem, juridicamente, a natureza de tributo.

Além das razões acima expostas, é imperioso citar a Lei Complementar Federal nº 24, de 7 de janeiro de 1975, que dispõe sobre os convênios para a concessão de isenções do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias (ICMS), da qual destaco os seguintes dispositivos:
            “Art. 1º As isenções do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias serão concedidas ou revogadas nos termos de convênios celebrados e ratificados pelos Estados e pelo Distrito Federal, segundo esta Lei.

            Parágrafo único. O disposto neste artigo também se aplica:

            .............................

            IV - à quaisquer outros incentivos ou favores fiscais ou financeiro-fiscais, concedidos com base no Imposto de Circulação de Mercadorias, dos quais resulte redução ou eliminação, direta ou indireta, do respectivo ônus;

            ..................................”
            “Art. 2º Os convênios a que alude o art. 1º, serão celebrados em reuniões para as quais tenham sido convocados representantes de todos os Estados e do Distrito Federal, sob a presidência de representantes do Governo federal.

            § 1º As reuniões se realizarão com a presença de representantes da maioria das Unidades da Federação.

            § 2º A concessão de benefícios dependerá sempre de decisão unânime dos Estados representados; a sua revogação total ou parcial dependerá de aprovação de quatro quintos, pelo menos, dos representantes presentes.

            ..................................”

A Lei Complementar Federal nº 24, de 1975, prevê, ainda, em seu art. 8º, inciso II, que a inobservância aos seus dispositivos acarretará, cumulativamente, a exigibilidade do imposto não pago ou devolvido e a ineficácia da lei ou ato que conceda remissão do débito correspondente. E arremata em seu art. 12, §§ 2º e 3º, que quaisquer outros benefícios fiscais concedidos pela legislação estadual, considerar-se-ão revogados se não forem convalidados por convênio realizado na forma por ela prevista, com aprovação de 2/3 (dois terços) dos representantes presentes do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ).

Assim, em razão das máculas apontadas, o projeto de lei em epígrafe não pode receber a chancela governamental.

À vista do exposto, com amparo nas manifestações da Procuradoria-Geral do Estado e da Secretaria de Estado de Fazenda não me resta outra alternativa senão a de adotar a dura medida do veto total, contando com a compreensão e a imprescindível aquiescência dos Senhores Deputados para a sua manutenção.
                      Atenciosamente,

                      ANDRÉ PUCCINELLI
                      Governador do Estado

A Sua Excelência o Senhor
Deputado JERSON DOMINGOS
Presidente da Assembleia Legislativa
CAMPO GRANDE-MS



MENSAGEM 50-2010 - VETO TOTAL.doc