Senhor Presidente,
Nos termos do § 1º do art. 70 e do inciso VIII do art. 89, ambos da Constituição Estadual, comunico a essa augusta Assembleia Legislativa, por intermédio de Vossa Excelência, que decidi vetar totalmente o projeto de lei que Dispõe sobre campanha permanente de divulgação da Tarifa Social de Energia Elétrica no Estado, pelas razões que, respeitosamente, peço vênia para passar a expor:
RAZÕES DO VETO:
Pretendeu o nobre Deputado, autor do projeto de lei, obrigar as concessionárias de energia elétrica do Estado a promover campanha publicitária permanente para divulgar a Tarifa Social de Energia Elétrica para consumidores enquadrados na Subclasse Residencial Baixa Renda e Cadastrados no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal, conforme aprovado na Lei Federal nº 12.212, de 20 de janeiro de 2010, bem como penaliza as que não cumprirem a lei com a repetição do indébito a favor do consumidor, em valor igual ao dobro do que tiver sido pago em excesso acrescido de atualização monetária e juros legais, conforme Lei Federal nº 8.078, de 11 de setembro de 1990.
Analisando o aludido projeto de lei observa-se que não trata de produção e consumo, mas sim de criar uma obrigatoriedade a uma concessionária prestadora de serviço público de energia elétrica, cuja competência exclusiva é da União, para explorar diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão os serviços em tela, nos termos do art. 21, inciso XII, “b”, da Constituição Federal, o que exige o veto jurídico.
Nesse diapasão, não compete ao Parlamento Estadual traçar normas a serem observadas por prestadoras de serviços públicos de competência da União.
Por seu turno, é de bom alvitre registrar que a União exerce sua competência legislativa, no que tange à matéria em comento, por meio da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), consoante o art. 22, inciso IV da Constituição Federal, que é responsável pela regulação e fiscalização da prestação dos serviços, desde a geração até a comercialização.
A ANEEL, por sua vez, editou diversas Resoluções regulamentando o cumprimento da Lei Federal nº 12.212, de 20 de janeiro de 2010, que Dispõe sobre a Tarifa Social de Energia Elétrica; altera as Leis nºs 9.991, de 24 de julho de 2000, 10.925, de 23 de julho de 2004, e 10.438, de 26 de abril de 2002; e dá outras providências.
Nesse contexto, importante destacar a Resolução nº 407, de 2010, da ANEEL, que estabeleceu:
Art. 16. Em até 60 (sessenta) dias, contados a partir da publicação desta Resolução, as distribuidoras devem informar a todos os titulares de unidades consumidoras da Classe Residencial e Subclasse Residencial Rural, por meio de mensagem clara e destacada na fatura de energia elétrica, por um período de seis meses, a respeito do direito à TSEE, desde que atendam ao disposto na Lei nº 12.212, de 2010.
Além disso, a Resolução nº 414, de 2010, da ANEEL, quando tratou de solicitações de fornecimento, veio a complementar:
Art. 27. Efetivada a solicitação de fornecimento, a distribuidora deve cientificar o interessado quanto à:
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§ 6º As distribuidoras devem oferecer ao solicitante de pedido de ligação ou de alteração de titularidade, das classes residencial e rural, todas as informações sobre os critérios definidos na Lei nº 12.212, de 2010, para o enquadramento nas Subclasses Residencial Baixa Renda.
...................................................
Dessa forma, observa-se que quem detém competência para normatizar tal matéria já exerceu sua atribuição, não podendo o Poder Legislativo Estadual, no escopo de disciplinar a matéria em referência, usurpar competência da União.
Nesse sentido, convém recordar a seguinte decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que conclui pela invalidade de leis estaduais ou distritais que pretendiam introduzir nova regulamentação na prestação de serviços públicos federais, mutatis mutandis:
Ação Direta de Inconstitucionalidade contra a expressão "energia elétrica", contida no caput do art. 1º da Lei nº 11.260/2002 do Estado de São Paulo, que proíbe o corte de energia elétrica, água e gás canalizado por falta de pagamento, sem prévia comunicação ao usuário. 2. Este Supremo Tribunal Federal possui firme entendimento no sentido da impossibilidade de interferência do Estado-membro nas relações jurídico-contratuais entre Poder concedente federal e as empresas concessionárias, especificamente no que tange a alterações das condições estipuladas em contrato de concessão de serviços públicos, sob regime federal, mediante a edição de leis estaduais. Precedentes. 3. Violação aos arts. 21, XII, b, 22, IV, e 175, caput e parágrafo único, incisos I, II e III da Constituição Federal. Inconstitucionalidade. 4. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada procedente. (STF, ADI 3729/SP, Rel. Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, j. 17/09/2007, DJ 09/11/2007, p. 29, RDDP 50/150-152); (grifos postos)
Nesse contexto, depreende-se da análise do texto do projeto de lei em epígrafe que os Parlamentares Estaduais, ao legislarem sobre a matéria em comento, extrapolam suas esferas de atuação, na medida em que pretendem obrigar as concessionárias de serviços de energia elétrica, localizadas no Estado de Mato Grosso do Sul, a promoverem campanhas publicitárias permanentes para divulgar a Tarifa Social de Energia Elétrica para consumidores enquadrados na Subclasse Residencial Baixa Renda e Cadastrados no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal, invadem a competência privativa da União para disciplinar o assunto, e ainda interferem nas relações jurídicos contratuais já firmadas entre o Poder concedente federal e as empresas concessionárias do serviço público de energia elétrica.
Não há que se falar que o projeto de lei sob exame estaria a cuidar da defesa do consumidor, porquanto o bem primeiro, do consumidor e do cidadão em geral, a ser resguardado no caso, é que cada ente federado cumpra a Constituição, motivo pelo qual não se pode admitir que um ente (Estado-membro), que não é titular da concessão e nem é parte na concessão interfira nessa relação, como advertiu a ministra CÁRMEM LÚCIA na ADI 3533/DF, “possa impor - por definição legal genérica - a uma das partes do contrato de concessão, de que é parte outra pessoa política (União), obrigações, ainda que o argumento de que tanto se daria para o bem do consumidor”.
Portanto, em virtude das máculas jurídicas constatadas no projeto de lei em tela não pode a proposição ingressar no ordenamento jurídico do Estado.
À vista do exposto, com amparo nas manifestações da Procuradoria-Geral do Estado e da Agência Estadual de Regulação de Serviços Públicos de Mato Grosso do Sul, não me resta outra alternativa senão a de adotar a dura medida do veto total, contando com a compreensão e a imprescindível aquiescência dos Senhores Deputados para a sua manutenção.
Atenciosamente,
ANDRÉ PUCCINELLI
Governador do Estado
A Sua Excelência o Senhor
Deputado JERSON DOMINGOS
Presidente da Assembleia Legislativa
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