Senhor Presidente,
Nos termos do § 1º do art. 70 e do inciso VIII do art. 89, ambos da Constituição Estadual, comunico a essa augusta Assembleia Legislativa, por intermédio de Vossa Excelência, que decidi vetar totalmente o projeto de lei que Dispõe sobre o incentivo de doação de medicamentos no âmbito de Mato Grosso do Sul e dá outras providências, pelas razões que, respeitosamente, peço vênia para expor:
RAZÕES DO VETO:
Pretendeu o ilustre Deputado, autor do projeto de lei, determinar que a Secretaria de Estado de Saúde incentive a doação e arrecadação de medicamentos armazenados nas casas e que não são mais utilizados para tratamento, com a finalidade de serem distribuídos à população carente atendida pelo Sistema Único de Saúde.
Embora nobre o intuito do parlamentar, a proposta em epígrafe esbarra, inicialmente, no disposto no art. 67, § 1º, inciso II, alínea “d”, da Constituição Estadual, uma vez que compete, privativamente, ao Chefe do Poder Executivo a iniciativa do processo legislativo que trata de matéria de natureza tipicamente administrativa, vinculada à criação, à organização, às atribuições e ao funcionamento de órgãos e às entidades da administração pública.
O Supremo Tribunal Federal1 vem decidindo, reiteradamente, que pelo princípio da simetria, cabe ao Governador do Estado dar o impulso inicial nos projetos de lei que disponham sobre as atribuições de secretarias e órgãos da administração pública estadual, consoante dispõem o art. 84, incisos II e IV e art. 61, § 1º, inciso II, alínea “e” da Constituição Federal, em razão do princípio da simetria.2
A proposição fere, ainda, o princípio da separação dos poderes encartados no art. 2º da Constituição Federal e reproduzido no art. 2º da Carta Estadual, na medida em que não cabe aos membros do Poder Legislativo impor obrigações ao Poder Executivo.
No que tange ao mérito, constata-se que, embora a finalidade pretendida pelo Deputado seja louvável, a medida é um tanto quanto arriscada, uma vez que os medicamentos são produtos, que pela sua própria natureza devem ser guardados em locais apropriados. Logo, diante da impossibilidade de apurar se os medicamentos que porventura forem doados foram conservados em ambiente adequado, é arriscado incentivar as doações.
Todo medicamento tem sua eficácia comprometida caso suas condições ideais de estocagem e armazenamento (iluminação, temperatura, umidade, não contaminação pelo contato com a pele e a mucosa) não sejam atendidas.
Assim, não há como garantir que as condições de armazenamento e transporte nas residências estejam adequadas, e ainda, não há como uma equipe de saúde avaliar se os medicamentos estão em condições de uso e se capazes de produzir os efeitos desejados.
Destarte, o eventual risco do uso de medicamentos armazenados em desconformidade com as medidas ideais suplanta a economia advinda dessa ação.
Por derradeiro, registro que o art. 1º do projeto de lei em análise, ao estabelecer que os medicamentos doados sejam distribuídos à população carente atendida pelo Sistema Único de Saúde (SUS), não guarda correspondência com o art. 196 da Constituição Federal e com a Lei Federal nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, na medida em que o SUS não atende apenas a pessoas carentes, mas sim aos cidadãos brasileiros.
Portanto, por entender que a proposta em epígrafe possui mácula procedimental que não se convalida com a sanção, e ainda, por considerar arriscada à medida que se pretende, encaminho a presente mensagem a essa Casa de Leis.
À vista do exposto, e com amparo na manifestação da Secretaria de Estado de Saúde, não me resta outra alternativa senão a de adotar a dura medida do veto total, contando com a compreensão e a imprescindível aquiescência dos Senhores Deputados para sua manutenção.
1ADIN 2417, Ministro Maurício Corrêa, DJ de 18.05.01 “Compete privativamente ao Governador do Estado, pelo princípio da simetria, propor à Assembléia Legislativa projetos de lei que visem à criação, estruturação e atribuições das Secretarias e órgãos da administração pública (CF, artigo 61, § 1º, II, “e”). Hipótese em que o projeto de iniciativa parlamentar, transformando-se em lei, apresenta vício insanável caracterizado pela invasão de competência reservada constitucionalmente ao Poder Executivo.”
2Ver também ADIN n. 2840 - 5 - ES, 15.10.03, Ministra Ellen Gracie.
Atenciosamente,
ANDRÉ PUCCINELLI
Governador do Estado A Sua Excelência o Senhor
Deputado JERSON DOMINGOS
Presidente da Assembleia Legislativa
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