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Publicado no Diário Oficial n. 8.908, de 28 de abril de 2015, páginas 59 a 63.
RESOLUÇÃO/SED n. 2.961, de 27 de abril de 2015.
Define Diretrizes para a Educação Escolar Indígena no Território Etnoeducacional Cone Sul.A SECRETÁRIA DE ESTADO DE EDUCAÇÃO no uso de suas atribuições legais e de conformidade com o disposto na alínea “c” do § 1o do art. 9o da Lei n. 4.024/61, com a redação dada pela Lei n. 9.131/95, na Lei n. 9.394/96, especialmente nos arts. 78 e 79, 26-A, § 4o do art. 26, § 3o do art. 32, bem como no Decreto n. 6.861/2009, e a Resolução n. 5 de 22 de junho de 2012, com fundamento no Parecer 2/2013, da Comissão Gestora dos TEE’S Cone Sul e Povos do Pantanal, CONSIDERANDO:
O direito a uma educação escolar diferenciada para os povos indígenas, assegurado pela Constituição Federal de 1988; pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre Povos Indígenas e Tribais, promulgada no Brasil por meio do Decreto n. 5.051/2004; pela Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 da Organização das Nações Unidas (ONU); pela Declaração das Nações Unidas sobre os direitos dos povos indígenas de 2007; pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/96), bem como por outros documentos nacionais e internacionais que visam assegurar o direito à educação como um direito humano e social;
As Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica (Parecer CNE/CEB n. 7/2010 e Resolução CNE/CEB n. 4/2010), as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (Parecer CNE/CEB n. 20/2009 e Resolução CNE/CEB n. 5/2009), as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental (Parecer CNE/CEB n. 11/2010 e Resolução CNE/CEB n. 7/2010), e as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (Parecer CNE/CEB n. 5/2011 e Resolução CNE/CEB n. 2/2012), além de outras que tratam das modalidades que compõem a Educação Básica;
As Diretrizes Nacionais para a Educação em Direitos Humanos definidas no Parecer CNE/CP n. 8/2012;
As recomendações do Parecer CNE/CEB n. 10/2011, que trata da oferta de língua estrangeira nas escolas indígenas de Ensino Médio;
As orientações do Parecer CNE/CEB n. 1/2011 e do Parecer CNE/CEB n. 9/2011, que tratam, respectivamente, de questionamento do Conselho de Educação Escolar Indígena do Amazonas a respeito da transformação do colegiado em órgão normativo, e da proposta de fortalecimento e implementação do regime de colaboração mediante arranjos de desenvolvimento da educação;
As deliberações da I Conferência Nacional de Educação Escolar Indígena, realizada em novembro de 2009, considerada espaço democrático privilegiado de debates e de decisões, com o intuito de celebrar, promover e fortalecer a Educação Escolar Indígena;
As determinações do Decreto n. 6.861/2009, que dispõe sobre a Educação Escolar Indígena e define sua organização em territórios etnoeducacionais; e
As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Escolar Indígena para a Educação Básica, Resolução n. 5/2012.
CONSIDERANDO, finalmente, as contribuições ao texto destas Diretrizes apresentadas pelos participantes das 4 etapas do Encontro Estadual para Elaboração dos Fundamentos Legais e Normativos da Educação Escolar Indígena de Mato Grosso do Sul, realizados, nos meses de abril, maio, junho e agosto do ano de 2013 pela Coordenadoria de Políticas Específicas para Educação, bem como aquelas enviadas por diversas pessoas e instituições durante o processo de consulta pública, resolve:
Art. 1o Esta Resolução define as Diretrizes para a Educação Escolar Indígena na Educação Básica do Território Etnoeducacional Cone Sul, oferecida em instituições próprias.
Parágrafo único. Estas Diretrizes estão pautadas pelos princípios da igualdade social, da diferença, da especificidade, do multilinguismo e da interculturalidade, fundamentos da Educação Escolar Indígena.
TÍTULO I
DOS OBJETIVOS
Art. 2o As Diretrizes para a Educação Escolar Indígena na Educação Básica têm por objetivos:
I - orientar as escolas indígenas de educação básica e os sistemas de ensino do Estado de Mato Grosso do Sul e dos Municípios cooperados no etnoterritório para elaboração, desenvolvimento e avaliação de seus projetos educativos;
II - orientar os processos de construção de instrumentos normativos visando tornar a Educação Escolar Indígena projeto orgânico, articulado e sequenciado de Educação Básica entre suas diferentes etapas e modalidades, sendo garantidas as especificidades dos processos educativos indígenas;
III - assegurar que os princípios da especificidade, do multilinguismo, da organização comunitária e da interculturalidade fundamentem os projetos educativos das comunidades indígenas, valorizando suas línguas e conhecimentos tradicionais;
IV - assegurar que o modelo de organização e gestão das escolas indígenas leve em consideração as práticas socioculturais e econômicas das respectivas comunidades, bem como suas formas de produção de conhecimento, processos próprios de ensino e de aprendizagem e projetos societários;
V - fortalecer o regime de colaboração entre os sistemas de ensino da União, do Estado, dos Municípios, fornecendo diretrizes para a organização da Educação Escolar Indígena na Educação Básica, no âmbito dos territórios etnoeducacionais;
VI - normatizar dispositivos constantes na Convenção 169, da Organização Internacional do Trabalho, ratificada no Brasil, por meio do Decreto Legislativo nº 143/2003, no que se refere à educação e meios de comunicação, bem como os mecanismos de consulta livre, prévia e informada;
VII - orientar os sistemas de ensino do Estado, e dos Municípios a incluir, tanto nos processos de formação de professores indígenas, quanto no funcionamento regular da Educação Escolar Indígena, a colaboração e atuação/contratação de especialistas em conhecimentos tradicionais, como os tocadores de instrumentos musicais, contadores de narrativas míticas, artesão, pajés e xamãs, rezadores, raizeiros, parteiras, organizadores de rituais, conselheiros e outras funções próprias e necessárias ao bem viver dos povos indígenas;
VIII - Garantir remuneração financeira do trabalho dos especialistas em saberes tradicionais, bem como transporte da aldeia ao local dos eventos, estadia e alimentação.
IX - zelar para que o direito à educação escolar diferenciada seja garantido às comunidades indígenas com qualidade social e pertinência pedagógica, cultural, linguística, ambiental e territorial, respeitando as lógicas, saberes e perspectivas dos próprios povos indígenas.
TÍTULO II
DOS PRINCÍPIOS DA EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA
Art. 3o Constituem objetivos da Educação Escolar Indígena proporcionar aos indígenas, suas comunidades e povos:
I - a recuperação/revitalização de suas memórias históricas; a reafirmação de suas identidades étnicas; a valorização de suas línguas, ciências e artes;
II - o acesso às informações, conhecimentos técnicos, tecnológicos, científicos e culturais da sociedade nacional e demais sociedades indígenas e não indígenas.
Parágrafo único. A Educação Escolar Indígena deve se constituir num espaço de construção de relações interétnicas orientadas para a manutenção da pluralidade cultural, pelo reconhecimento de diferentes concepções pedagógicas e pela afirmação dos povos indígenas como sujeitos de direitos.
Art. 4o Constituem elementos básicos para a organização, a estrutura e o funcionamento da escola indígena:
I - a centralidade do território para o bem viver dos povos indígenas e para seus processos formativos e, portanto, a localização das escolas em terras habitadas por comunidades indígenas, ainda que se estendam por territórios do Estado ou Municípios contíguos e/ou terras não homologadas;
II - a importância das línguas indígenas e dos registros linguísticos específicos da Língua Portuguesa para o ensino ministrado nas línguas indígenas das comunidades indígenas, como uma das formas de preservação da realidade sociolinguística de cada povo/comunidade;
III – propiciar meios que favoreçam a política linguística na organização da grafia das línguas indígenas de cada etnia, respeitando sua variante linguística;
IV - a organização escolar própria, nos termos detalhados nesta Resolução;
V - a exclusividade do atendimento as comunidades indígenas por parte de professores indígenas oriundos da respectiva etnia.
Parágrafo único. A escola indígena será criada em atendimento à reivindicação ou por iniciativa da comunidade interessada, ou com a anuência da mesma, respeitadas suas formas de representação.
Art. 5o Na organização da escola indígena deverá ser considerada a participação de representantes da comunidade, na definição do modelo de organização e gestão, bem como:
I - suas estruturas sociais;
II - suas práticas socioculturais, religiosas e econômicas;
III - suas formas de produção de conhecimento, processos próprios e métodos de ensino-aprendizagem;
IV - o uso de materiais didático-pedagógicos produzidos de acordo com o contexto sociocultural de cada povo indígena;
V - a necessidade de edificação de escolas com características e padrões construtivos de comum acordo com as comunidades usuárias, ou da predisposição de espaços formativos que atendam aos interesses das comunidades indígenas.
VI – Comissão permanente na escola para pesquisa, sistematização, elaboração e editoração de material didático.
Art. 6o Os sistemas de ensino devem assegurar às escolas indígenas estrutura adequada às necessidades dos alunos, professores e das especificidades pedagógicas da educação diferenciada, garantindo laboratórios, sala multifuncional, sala de tecnologias, bibliotecas, espaços para atividades esportivas e artístico-culturais, assim como equipamentos que garantam a oferta de uma educação escolar de qualidade sociocultural.
TÍTULO III
DA ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA
Art. 7o A organização das escolas indígenas e das atividades consideradas letivas podem assumir variadas formas, como séries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de estudos com tempos e espaços específicos, com base na idade, na competência e em outros critérios, ou por forma diversa de organização, sempre que o interesse do processo de aprendizagem assim o recomendar.
§ 1o Em todos os níveis e modalidades da Educação Escolar Indígena Estadual e Municipal devem ser garantidos os princípios da igualdade social, da diferença, da especificidade, do multilinguismo e da interculturalidade, contando preferencialmente com professores e gestores das escolas indígenas, membros da respectiva etnia indígena.
§ 2o Os conhecimentos e práticas indígenas devem propiciar o diálogo com conhecimentos não indígenas, de modo a valorizar os modos próprios de conhecer, investigar e sistematizar de cada povo indígena, valorizando a oralidade e a história indígena.
§ 3o A Educação Escolar Indígena deve contribuir para o projeto societário e para o bem viver de cada comunidade indígena, contemplando ações voltadas à manutenção, preservação e ampliação de seus territórios e dos recursos neles existentes.
§ 4o A Educação Escolar Indígena será acompanhada pelos sistemas de ensino, por meio da prática constante de produção e publicação de materiais didáticos diferenciados na língua indígena, portuguesa e bilíngue (nos anos iniciais), multilíngue (anos finais), elaborados pelos professores indígenas em articulação com os estudantes indígenas, para todas as áreas de conhecimento.
§ 5o Os sistemas de ensino deverão assessorar, apoiar técnica e financeiramente as escolas indígenas estaduais e municipais que compõem o território etnoeducacional para a produção de material didático.
Parágrafo Único. Que os sistemas de ensino do território etnoeducacional criem comissões locais e regionais que deem suporte à preparação de material didático.
Art. 8o A Educação Infantil, etapa educativa e de cuidados, é um direito dos povos indígenas que deve ser garantido e realizado com o compromisso de qualidade sociocultural e de respeito aos preceitos da educação diferenciada e específica.
§ 1o A Educação Infantil pode ser também uma opção de cada comunidade indígena que tem a prerrogativa de, ao avaliar suas funções e objetivos a partir de suas referências culturais, decidir sobre a implantação ou não da mesma, bem como sobre a idade de matrícula de suas crianças na escola.
§ 2o Os sistemas de ensino devem promover consulta livre, prévia e informada acerca da oferta da Educação Infantil a todos os envolvidos com a educação das crianças indígenas, tais como pais, mães, avós, “os mais velhos”, professores, gestores escolares e lideranças comunitárias, visando a uma avaliação que expresse os interesses legítimos de cada comunidade indígena.
§ 3o As escolas indígenas que ofertam a Educação Infantil devem:
I - promover a participação das famílias e dos sábios, especialistas nos conhecimentos tradicionais de cada comunidade, em todas as fases de implantação e desenvolvimento da Educação Infantil;
II - definir em seus projetos pedagógicos em que língua ou línguas serão desenvolvidas as atividades escolares, de forma a garantir o uso das línguas indígenas no processo de ensino e aprendizagem;
III - considerar as práticas de educar e de cuidar de cada comunidade indígena como parte fundamental da educação escolar das crianças de acordo com seus espaços e tempos socioculturais;
IV - elaborar materiais didáticos específicos e de apoio pedagógico para a Educação Infantil, garantindo a incorporação de aspectos socioculturais indígenas significativos e contextualizados para a comunidade indígena de pertencimento da criança;
V - reconhecer as atividades socioculturais desenvolvidas nos diversos espaços institucionais de convivência e sociabilidade de cada comunidade indígena – casas da cultura, centros comunitários, museus indígenas, casas da memória, casa de reza, bem como outros espaços tradicionais de formação – como atividades letivas, definidas nos projetos pedagógicos e nos calendários escolares.
VI – Garantir que os professores da Educação Infantil sejam indígenas pertencentes à comunidade.
VII – Assegurar espaço físico com mobiliário adequado à faixa etária da criança.
Parágrafo único. Que o atendimento à Educação Infantil nas escolas indígenas, seja de acordo com a demanda e as especificidades.
Art. 9o O Ensino Fundamental, direito público subjetivo, aliado à ação educativa da família e da comunidade, deve se constituir em tempo e espaço de formação para a cidadania indígena plena, articulada tanto ao direito à diferença quanto ao direito à igualdade.
§ 1o O Ensino Fundamental deve garantir aos alunos indígenas condições favoráveis à construção do bem viver de suas comunidades, aliando, em sua formação escolar, conhecimentos indígenas e não indígenas.
§ 2o O Ensino Fundamental deve promover o acesso aos códigos da leitura e da escrita indígena e não indígena, aos conhecimentos ligados às ciências humanas, da natureza, matemáticas, linguagens, bem como do desenvolvimento das capacidades individuais e coletivas necessárias ao convívio sociocultural da pessoa indígena com sua comunidade de pertença e com outras sociedades.
§ 3o No Ensino Fundamental as práticas educativas e as práticas do cuidar são indissociáveis visando o pleno atendimento das necessidades dos alunos indígenas em seus diferentes momentos de vida: infâncias, juventudes e fase adulta.
§ 4o A oferta do Ensino Fundamental, como direito público subjetivo, é de obrigação, do Estado que, para isso, deve promover a universalização nas comunidades indígenas que demandarem essa etapa de escolarização.
§ 5o Reconhecer as atividades socioculturais desenvolvidas nos diversos espaços institucionais de convivência e sociabilidade de cada comunidade indígena – casas da cultura, centros comunitários, museus indígenas, casas da memória, bem como outros espaços tradicionais de formação – como atividades letivas, definidas nos projetos pedagógicos e nos calendários escolares.
Art. 10. O Ensino Médio, um dos meios de fortalecimento dos laços de pertencimento identitário dos alunos com seus grupos sociais de origem, deve favorecer a continuidade sociocultural dos grupos comunitários em seus territórios.
§ 1o As propostas de Ensino Médio devem promover o protagonismo dos estudantes indígenas, ofertando-lhes uma formação ampla, não fragmentada, que oportunize o desenvolvimento das capacidades de análise e de tomada de decisões, resolução de problemas, flexibilidade para continuar o aprendizado de diversos conhecimentos necessários a suas interações com seu grupo de pertencimento e com outras sociedades indígenas e não indígenas.
§ 2o O Ensino Médio deve garantir aos alunos indígenas condições necessárias à construção do bem viver de suas comunidades, aliando, em sua formação escolar, conhecimentos indígenas e não indígenas com práticas culturais próprias de seus grupos étnicos de pertencimento, num processo educativo dialógico e transformador.
§ 3o Cabe aos sistemas de ensino, por meio de ações colaborativas, promover consulta livre, prévia e informada sobre o tipo de Ensino Médio adequado às diversas comunidades indígenas, realizando diagnóstico das demandas relativas a essa etapa da Educação Básica em cada realidade sociocultural indígena.
§ 4o As comunidades indígenas, por meio de seus projetos de educação escolar, têm a prerrogativa de decidir o tipo de Ensino Médio adequado aos seus modos de vida e organização societária, nos termos da Resolução CNE/CEB nº 2/2012.
§ 5o Na definição do Ensino Médio que atenda às necessidades dos povos indígenas, o uso de suas línguas se constitui em importante estratégia pedagógica para a valorização e promoção da diversidade sociolinguística brasileira.
§ 6o O ensino em língua indígena será ofertado por meio de referencial específico, preferencialmente por professores habilitados e/ou com formação inicial e continuada na área de linguagens e com domínio da língua indígena.
§ 7o Reconhecer as atividades socioculturais desenvolvidas nos diversos espaços institucionais de convivência e sociabilidade de cada comunidade indígena – casas da cultura, centros comunitários, museus indígenas, casas da memória, bem como outros espaços tradicionais de formação – como atividades letivas, definidas nos projetos pedagógicos e nos calendários escolares.
Parágrafo Único. Garantir preferencialmente que em toda Educação Básica no Território Etnoeducacional Cone Sul que os professores sejam indígenas habilitados em cursos de formação superior.
Art. 11. A Educação Especial é uma modalidade de ensino que visa assegurar aos alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e com altas habilidades e superdotação, o desenvolvimento das suas potencialidades socioeducacionais em todas as etapas e modalidades da Educação Básica nas escolas indígenas, por meio da oferta de Atendimento Educacional Especializado (AEE).
§ 1o O sistema estadual e municipal em sua função executora de políticas públicas educacionais, articulado com o sistema federal de ensino, na perspectiva do território etnoeducacional devem realizar diagnósticos da demanda por Educação Especial nas comunidades indígenas, visando criar uma política de atendimento aos estudantes indígenas que necessitem de Atendimento Educacional Especializado (AEE).
§ 2o Os sistemas de ensino devem assegurar a acessibilidade aos alunos indígenas com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e com altas habilidades e superdotação, por meio de prédios escolares, equipamentos, mobiliários, transporte escolar, recursos humanos e outros materiais adaptados às necessidades desses alunos.
§ 3o No caso dos alunos que apresentem necessidades diferenciadas de comunicação, o acesso aos conteúdos deve ser garantido por meio da utilização de linguagens e códigos aplicáveis, como o sistema Braille, a Língua Brasileira de Sinais e os sinais indígenas emergentes, sem prejuízo do aprendizado da língua portuguesa e da língua indígena, facultando-lhes e às suas famílias a opção pela abordagem pedagógica que julgarem adequada, ouvidos os profissionais especializados em cada caso voltada à garantia da educação de qualidade sociocultural como um direito dos povos indígenas.
§ 4o Para que o direito à aprendizagem dos alunos indígenas da Educação Especial seja assegurado, é necessário também que as instituições de pesquisa desenvolvam estudos com o objetivo de identificar e aprimorar a Língua Brasileira de Sinais ou outros sistemas de comunicação próprios utilizados entre pessoas surdas indígenas em suas respectivas comunidades.
§ 5o Na identificação das necessidades educacionais especiais dos alunos indígenas, além da experiência dos professores indígenas, da opinião da família, das questões culturais, a escola indígena deve contar com assessoramento técnico especializado indígena e o apoio da equipe responsável pela Educação Especial em parceria com as instâncias administrativas da Educação Escolar Indígena nos sistemas de ensino.
§ 6o O atendimento educacional especializado na Educação Escolar Indígena deve assegurar a igualdade de condições para o acesso, permanência e conclusão dos alunos que demandam esse atendimento.
§ 7o Garantir a formação especializada para professores indígenas na área de educação especial de acordo com a demanda.
§ 8o Assegurar avaliação diagnóstica imediata do aluno que apresenta necessidades especiais (ANEE).
Art. 12. A Educação de Jovens e Adultos caracteriza-se como uma proposta pedagógica flexível, com finalidades e funções específicas e tempo de duração definido, levando em consideração os conhecimentos das experiências de vida dos jovens e adultos, ligadas às vivências cotidianas individuais e coletivas, bem como ao trabalho.
§ 1o Na Educação Escolar Indígena, a Educação de Jovens e Adultos deve atender às realidades socioculturais e interesses das comunidades indígenas, vinculando-se aos seus projetos de presente e futuro, sendo necessária a contextualização da sua proposta pedagógica de acordo com as questões socioculturais da comunidade.
§ 2o A oferta de Educação de Jovens e Adultos no Ensino Fundamental não deve substituir a oferta regular dessa etapa da Educação Básica na Educação Escolar Indígena, independente da idade.
§ 3o Na Educação Escolar Indígena, as propostas educativas de Educação de Jovens e Adultos, numa perspectiva de formação ampla, devem favorecer o desenvolvimento de uma educação profissional que possibilite aos jovens e adultos indígenas atuarem nas atividades socioeconômicas e culturais de suas comunidades com vistas à construção do protagonismo indígena e da sustentabilidade de seus territórios.
Art. 13. A Educação Profissional e Tecnológica na Educação Escolar Indígena deve articular os princípios da formação ampla, sustentabilidade socioambiental e respeito à diversidade dos estudantes, considerando-se as formas de organização das sociedades indígenas e suas diferenças sociais, políticas, econômicas e culturais, devendo:
§ 1o Contribuir na construção da gestão territorial autônoma, possibilitando a elaboração de projetos de desenvolvimento sustentável e de produção alternativa para as comunidades indígenas, tendo em vista, em muitos casos, as situações de desassistência e falta de apoio para seus processos produtivos;
§ 2o Articular-se aos projetos comunitários, definidos a partir das demandas coletivas dos grupos indígenas, contribuindo para a reflexão e construção de alternativas de gestão autônoma dos seus territórios, de sustentabilidade econômica, de segurança alimentar, de educação, de saúde e de atendimento às mais diversas necessidades cotidianas;
§ 3o Proporcionar aos alunos indígenas oportunidades de atuação em diferentes áreas do trabalho técnico, necessárias ao desenvolvimento de suas comunidades, como as da tecnologia da informação, saúde, gestão territorial e ambiental, magistério e outras.
Parágrafo único. A Educação Profissional e Tecnológica nas diferentes etapas e modalidades da Educação Básica, no território etnoeducacional, pode ser realizada de modo interinstitucional, em convênio com as instituições de Educação Profissional e Tecnológica; Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia; instituições de Educação Superior; outras instituições de ensino e pesquisa, bem como com organizações indígenas e indigenistas, de acordo com a realidade de cada comunidade, sendo ofertada, preferencialmente, nas terras indígenas.
TÍTULO IV
DO PROJETO PEDAGÓGICO DAS ESCOLAS INDÍGENAS
Art. 14. O projeto pedagógico, expressão da autonomia e da identidade escolar, é uma referência importante na garantia do direito a uma educação escolar diferenciada, devendo apresentar os princípios e objetivos da Educação Escolar Indígena de acordo com as diretrizes curriculares instituídas nacional e do Território Etnoeducacional Povos do Pantanal, bem como as aspirações das comunidades indígenas em relação à educação escolar.
§ 1o Na Educação Escolar Indígena, os projetos pedagógicos devem estar intrinsecamente relacionados com os modos de bem viver dos grupos étnicos em seus territórios, devendo estar alicerçados nos princípios da interculturalidade, bilinguismo e multilinguismo, especificidade, organização comunitária e territorialidade.
§ 2o O projeto pedagógico da escola indígena, construído de forma autônoma e coletiva, valorizando os conhecimentos, a oralidade e a história de cada povo em diálogo com os demais conhecimentos produzidos por outras sociedades humanas, deve se articular aos projetos societários etnopolíticos das comunidades indígenas contemplando a gestão territorial e ambiental das terras indígenas e a sustentabilidade das comunidades indígenas.
§ 3o A questão da territorialidade, associada à sustentabilidade socioambiental e cultural das comunidades indígenas, deve orientar o processo educativo definido no projeto pedagógico com o intuito de fazer com que a escola contribua para a continuidade sociocultural dos grupos indígenas em seus territórios, possibilitando o desenvolvimento de estratégias que viabilizem os seus projetos de bem viver.
§ 4o As escolas indígenas, na definição dos seus projetos pedagógicos, possuem autonomia para organizar suas práticas pedagógicas em ciclos, seriação, módulos, etapas, em regimes de alternância, de tempo integral ou outra forma de organização que melhor atenda às especificidades de cada contexto escolar e comunitário indígena.
§ 5o Os projetos pedagógicos das escolas indígenas devem ser elaborados pelos gestores e professores indígenas em articulação com toda a comunidade educativa – lideranças, “os mais velhos”, pais, mães ou responsáveis pelo aluno, os próprios alunos –, contando com assessoria dos sistemas de ensino e de suas instituições formadoras, IES das organizações indígenas e órgãos indigenistas do estado e da sociedade civil e serem objeto de consulta livre, prévia e informada, para sua aprovação comunitária e reconhecimento junto aos sistemas de ensino.
§ 6o Os sistemas de ensino, em parceria com as organizações indígenas, Fundação Nacional do Índio (FUNAI), instituições de Educação Superior, bem como outras organizações governamentais e não governamentais, devem criar programas de assessoria especializada em Educação Escolar Indígena objetivando dar suporte para o funcionamento das escolas indígenas na execução do seu projeto pedagógico.
Seção I
Dos Currículos da Educação Escolar Indígena
Art. 15. O currículo das escolas indígenas, ligado às concepções e práticas que definem o papel sociocultural da escola, diz respeito aos modos de organização dos tempos e espaços da escola, de suas atividades pedagógicas, das relações sociais tecidas no cotidiano escolar, das interações do ambiente educacional com a sociedade, das relações de poder presentes no fazer educativo e nas formas de conceber e construir conhecimentos escolares, constituindo parte importante dos processos sociopolíticos e culturais de construção de identidades.
§ 1o Os currículos da Educação Básica na Educação Escolar Indígena, em uma perspectiva intercultural, devem ser construídos a partir dos valores e interesses etnopolíticos das comunidades indígenas em relação aos seus projetos de sociedade e de escola, definidos nos projetos pedagógicos.
§ 2o Componente pedagógico dinâmico, o currículo deve ser flexível, adaptado aos contextos socioculturais das comunidades indígenas em seus projetos de Educação Escolar Indígena.
§ 3o Na construção dos currículos da Educação Escolar Indígena, devem ser consideradas as condições de escolarização dos alunos indígenas em cada etapa e modalidade de ensino; as condições de trabalho do professor; os espaços e tempos da escola e de outras instituições educativas da comunidade e fora dela, tais como museus, memoriais da cultura, casas de cultura, casas de reza, centros culturais, laboratórios de ciências e de informática.
§ 4o O currículo na Educação Escolar Indígena pode ser organizado por eixos temáticos, projetos de pesquisa, eixos geradores ou matrizes conceituais, em que os conteúdos dos diversos componentes curriculares podem ser trabalhados numa perspectiva interdisciplinar e intercultural.
§ 5o Os currículos devem ser ancorados em materiais didáticos específicos, escritos na língua portuguesa, nas línguas indígenas e bilíngue/multilíngue, que reflitam a perspectiva intercultural da educação diferenciada, elaborados pelos professores indígenas e seus alunos e publicados pelos respectivos sistemas de ensino.
§ 6o Na organização curricular das escolas indígenas, devem ser observados os critérios:
I - de reconhecimento das especificidades das escolas indígenas quanto aos seus aspectos comunitários, bilíngues e multilíngues, de interculturalidade e diferenciação;
II - de flexibilidade na organização dos tempos e espaços curriculares, tanto no que se referem à base nacional comum, quanto à parte diversificada, de modo a garantir a inclusão dos conhecimentos e procedimentos culturais produzidos pelas comunidades indígenas, tais como saberes, línguas indígenas, crenças, memórias, conhecimentos ligados à identidade étnica, às suas organizações sociais, às relações humanas, às manifestações artísticas, às práticas desportivas e tecnológicas;
III - de duração mínima anual de duzentos dias letivos, perfazendo, no mínimo, oitocentas horas, respeitando-se a flexibilidade do calendário das escolas indígenas que poderá ser organizado independente do ano civil, de acordo com as atividades produtivas e socioculturais das comunidades indígenas;
IV - de adequação da estrutura física dos prédios escolares às condições socioculturais e ambientais das comunidades indígenas, bem como às necessidades dos alunos nas diferentes etapas e modalidades da Educação Básica.
V - de interculturalidade, de interdisciplinaridade na contextualização e articulação entre os diferentes campos do conhecimento, por meio do diálogo entre disciplinas diversas e do estudo e pesquisa de temas da realidade dos alunos e de suas comunidades;
VI - de adequação das metodologias didáticas e pedagógicas às características dos diferentes sujeitos das aprendizagens, em atenção aos modos próprios de ensino e aprendizagem do conhecimento indígena;
VII - da necessidade de elaboração e uso de materiais didáticos próprios, nas línguas indígenas e em língua portuguesa, apresentando conteúdos culturais próprios às comunidades indígenas;
VIII - de cuidado e educação das crianças nos casos em que a oferta da Educação Infantil for solicitada pela comunidade dando ênfase à ludicidade indígena.
IX - de atendimento educacional especializado, complementar ou suplementar à formação dos alunos indígenas que apresentem tal necessidade.
X - Abertura de turmas de acordo com a demanda da comunidade considerando as particularidades de cada povo, onde o número de matriculados não ultrapasse 20 alunos.
Art. 16. As observações destes critérios demandam, por parte dos sistemas de ensino e de suas instituições formadoras, a criação das condições para a construção e o desenvolvimento dos currículos das escolas indígenas com a participação das comunidades indígenas, promovendo a gestão comunitária, democrática e diferenciada da Educação Escolar Indígena, bem como a formação inicial e continuada dos professores indígenas – docentes, gestores e técnicos dos setores do sistema de ensino – que privilegie a discussão a respeito das propostas curriculares das escolas indígenas em atenção aos interesses e especificidades de suas respectivas comunidades.
Seção II
Da Avaliação
Art. 17. A avaliação, como um dos elementos que compõe o processo de ensino e aprendizagem, é uma estratégia didática que deve ter seus fundamentos e procedimentos definidos no projeto pedagógico, ser articulada à proposta curricular, às metodologias, ao modelo de planejamento e gestão, à formação inicial e continuada dos professores e demais profissionais da educação, bem como ao regimento escolar das escolas indígenas, devendo, portanto, aprimorar o projeto pedagógico da Educação Escolar Indígena.
§ 1o A avaliação deve estar associada aos processos de ensino e aprendizagem próprios, reportando-se às dimensões de participação e de protagonismo indígena, objetivando a formação de sujeitos socio-históricos autônomos, que atuem ativamente na construção do bem viver de seus grupos comunitários.
§ 2o A avaliação do processo de ensino e aprendizagem na Educação Escolar Indígena deve ter como base os aspectos qualitativos, quantitativos, diagnósticos, processuais, formativos, dialógicos e participativos, considerando-se o direito de aprender, as experiências de vida dos diferentes atores sociais e suas características culturais, os valores, as dimensões cognitiva, afetiva, emocional, lúdica, de desenvolvimento físico e motor, dentre outros.
§ 3o As escolas indígenas devem desenvolver práticas de avaliações que possibilitem a reflexão de suas ações pedagógicas no sentido de reorientá-las para o aprimoramento dos seus projetos educativos, da relação com a comunidade, da relação entre professor e aluno, assim como da gestão comunitária.
§ 4o Garantir a avaliação de classificação dos alunos retidos levando em consideração seu desempenho anual, segundo resolução do Conselho Estadual de Educação.
§ 5o Nos processos de regularização das escolas indígenas, os Conselhos de Educação Estadual, municipal e o Conselho Estadual de Educação Escolar Indígena devem criar parâmetros de avaliação interna e externa que atendam às especificidades das comunidades indígenas garantindo-lhes o reconhecimento das normas e ordenamentos jurídicos próprios, considerando:
I - suas estruturas sociais, suas práticas socioculturais e suas atividades econômicas.
II - suas formas de produção de conhecimento e seus processos próprios e métodos de ensino aprendizagem.
Art. 18. A inserção da Educação Escolar Indígena nos processos de avaliação institucional das redes da Educação Básica deve estar condicionada à adequação desses processos às especificidades da Educação Escolar Indígena.
Parágrafo Único. A avaliação institucional da Educação Escolar Indígena deve contar necessariamente com a participação e contribuição de professores e lideranças indígenas e conter instrumentos avaliativos específicos que atendam aos projetos pedagógicos das escolas indígenas.
Seção III
Dos Professores Indígenas: Formação e Profissionalização
Art. 19. A qualidade sociocultural da Educação Escolar Indígena necessita que sua proposta educativa seja conduzida por professores indígenas, como docentes e como gestores, pertencentes às suas respectivas etnias.
§ 1o Os professores indígenas, no cenário político e pedagógico, são importantes interlocutores nos processos de construção do diálogo intercultural, mediando e articulando os interesses de suas comunidades com os das sociedades indígenas e não-indígenas e com os de outros grupos particulares, promovendo a sistematização e organização de novos conhecimentos e práticas.
§ 2o Compete aos professores indígenas à tarefa de refletir criticamente sobre as práticas políticas pedagógicas da Educação Escolar Indígena, buscando criar estratégias para promover a interação dos diversos tipos de conhecimentos que se apresentam e se entrelaçam no processo escolar: de um lado, os conhecimentos não indígenas, a que todo aluno, indígena ou não, deve ter acesso, e, de outro, os conhecimentos indígenas, próprios ao seu grupo social de origem que hoje assumem importância crescente nos contextos escolares indígenas.
Art. 20. Formar indígenas para serem professores e gestores das escolas indígenas deve ser uma das prioridades dos sistemas de ensino e de suas instituições formadoras, visando consolidar a Educação Escolar Indígena como um compromisso público do Estado brasileiro, do estado de Mato Grosso do Sul e dos municípios que compõem o Território Etnoeducacional Cone Sul.
§ 1o A formação inicial dos professores indígenas deve ocorrer em cursos específicos de licenciaturas e pedagogias interculturais ou complementarmente, quando for o caso, em outros cursos de licenciatura específica ou, ainda, em cursos de normal médio indígena com componente curricular específico em língua indígena.
§ 2o A formação inicial será ofertada em serviço e, quando for o caso, concomitante com a própria escolarização dos professores indígenas.
§ 3o Os cursos de formação de professores indígenas, em nível médio ou licenciatura, devem enfatizar a constituição de competências referenciadas em conhecimentos, saberes, valores, habilidades e atitudes pautadas nos princípios da Educação Escolar Indígena.
§ 4o A formação de professores indígenas deve estar voltada para a elaboração, desenvolvimento e a avaliação de currículos e programas próprios, bem como a produção de materiais didáticos específicos e a utilização de metodologias próprias de ensino e pesquisa.
§ 5o Os sistemas de ensino e suas instituições formadoras devem garantir conforme a demanda os meios de acesso, permanência e conclusão, por meio da elaboração de planos estratégicos diferenciados, para que os professores indígenas tenham uma formação com qualidade sociocultural, em regime de colaboração com outros órgãos de ensino.
§ 6o Os sistemas de ensino e suas instituições formadoras devem assegurar a formação continuada específica dos professores indígenas, compreendida como componente essencial da profissionalização docente e estratégia de continuidade do processo formativo, articulada à realidade da escola indígena e à formação inicial dos seus professores.
§ 7o O atendimento às necessidades de formação continuada de profissionais do magistério indígena dar-se-á pela oferta de cursos e atividades formativas criadas e desenvolvidas pelas instituições públicas de educação, cultura e pesquisa, sendo um processo contínuo em consonância com os projetos das escolas indígenas e dos sistemas de ensino.
§ 8o A formação continuada dos profissionais do magistério indígena dar-se-á por meio de cursos presenciais e/ou semipresenciais, por meio de atividades formativas e cursos de atualização, aperfeiçoamento, especialização, bem como programas de mestrado ou doutorado.
§ 9o Organizações indígenas e não indígenas podem ofertar formação inicial e continuada de professores indígenas, desde que solicitadas pelas comunidades indígenas, e terem suas propostas de formação autorizadas e reconhecidas pelos respectivos Conselhos Estaduais de Educação.
§ 10o Garantir a formação de profissionais indígenas para o atendimento a Educação Especial.
Parágrafo único: Propiciar formação continuada a todos os servidores da Educação Escolar Indígena.
Art. 21. A profissionalização dos professores indígenas, compromisso ético e político do Estado brasileiro através dos entes cooperados, deve ser promovida por meio da formação inicial e continuada, bem como pela implementação de estratégias de reconhecimento e valorização da função sociopolítica e cultural dos professores indígenas, tais como:
§ 1o Criação da categoria professor indígena como carreira específica do magistério público nos sistemas de ensino do Território Etnoeducacional Cone Sul.
§ 2o Promoção de concurso público adequado às particularidades linguísticas e culturais das comunidades indígenas;
§ 3o Garantia das condições de remuneração, compatível com sua formação e isonomia salarial;
§ 4o Garantia da jornada de trabalho, nos termos da Lei n° 11.738/2008;
§ 5o Garantia de condições condignas de trabalho.
I - essas garantias devem ser aplicadas não só aos professores indígenas que exercem a docência, mas também àqueles que exercem as funções de gestão nos sistemas de ensino, tanto nas próprias escolas indígenas quanto nas Secretarias de Educação ou nos seus órgãos afins.
II - para professores e gestores que atuem ou não nas escolas indígenas, os sistemas de ensino devem também promover a formação inicial e continuada nas áreas de Educação Especial, língua indígena, da gestão democrática, comunitária e diferenciada da Educação Escolar Indígena, visando uma melhor adequação das atividades de elaboração, execução e avaliação do projeto pedagógico das escolas e das redes de ensino.
§ 6o Recomenda-se aos sistemas de ensino garantir a criação de uma comissão paritária composta pelos representantes das Secretarias de Educação, das lideranças comunitárias e dos professores indígenas para a regularização da carreira do magistério indígena bem como, quando de sua implantação, a sua adequada avaliação, visando à elaboração e implementação de políticas públicas voltadas para a garantia da qualidade sociocultural da Educação Escolar Indígena.
§ 7o Essa comissão será subsidiada financeiramente pelo estado de Mato Grosso do Sul na perspectiva do Território Etnoeducacional Povos do Pantanal e terá suas funções acompanhadas no âmbito dos espaços institucionais criados nos diferentes sistemas de ensino para tratar das políticas de Educação Escolar Indígena tais como comitês, fóruns, comissões ou Conselhos de Educação Escolar Indígena.
.TÍTULO V
DA AÇÃO COLABORATIVA PARA A GARANTIA DA EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA
Seção I
Das competências constitucionais e legais no exercício do regime de colaboração
Art. 22. As políticas de Educação Escolar Indígena serão efetivadas no Território Etnoeducacional Cone Sul, por meio da articulação entre os diferentes sistemas de ensino, definindo-se, no âmbito do regime de colaboração, suas competências e corresponsabilidades.
Art. 23. Na oferta e promoção da Educação Escolar Indígena para os povos indígenas é exigido, no plano institucional, administrativo e organizacional do Estado de Mato Grosso do Sul o estabelecimento e o cumprimento articulado de normas específicas de acordo com as competências constitucionais e legais estabelecidas, em regime de colaboração.
Art. 24. Constituem atribuições do Estado de Mato Grosso do Sul no âmbito do Território Etnoeducacional Cone Sul:
I - ofertar e executar a Educação Escolar Indígena diretamente ou por meio de regime de colaboração com seus Municípios;
II - estruturar, na Secretaria Estadual de Educação, a coordenação de Educação Escolar Indígena garantindo a representação de indígenas e a participação de profissionais conhecedores das questões indígenas, destinando-lhes recursos financeiros específicos para a execução dos programas de Educação Escolar Indígena;
III - criar e regularizar as escolas indígenas como unidades próprias, autônomas e específicas no sistema estadual de ensino;
IV - implementar e desenvolver as ações pactuadas no plano de ação elaborado pela comissão gestora do Território Etnoeducacional Cone Sul;
V - prover as escolas indígenas de recursos financeiros, humanos e materiais visando ao pleno atendimento da Educação Básica para as comunidades indígenas;
VI - instituir e regulamentar o magistério indígena por meio da criação da categoria de professor indígena, admitindo os professores indígenas nos quadros do magistério público mediante concurso específico;
VII - promover a formação inicial de professores indígenas.
VIII - assegurar a formação continuada de professores indígenas e não indígenas – gestores e técnicos das secretarias.
IX - promover a elaboração e publicação sistemática de material didático e pedagógico, específico e diferenciado para uso nas escolas indígenas, contemplando a realidade sociocultural.
X - garantir aos professores indígenas em suas horas atividades momentos para pesquisa e produção de materiais.
§ 1o As atribuições do Estado com a oferta da Educação Escolar Indígena poderão ser realizadas em regime de colaboração com os municípios, ouvidas as comunidades indígenas, desde que estes tenham se constituído em sistemas de educação próprios e disponham de condições técnicas e financeiras adequadas.
§ 2o As atribuições do Estado se aplicam aos Municípios do Território Etnoeducacional Cone Sul no que couber.
Art. 25. Constituem atribuições do Conselho Estadual de Educação em consonância com o Conselho Estadual de Educação Escolar Indígena:
I - estabelecer critérios específicos para criação e regularização das escolas indígenas e dos cursos de formação de professores indígenas;
II - autorizar o funcionamento e reconhecimento das escolas indígenas e dos cursos de formação de professores indígenas;
III - regularizar a vida escolar dos estudantes indígenas, quando for o caso.
Parágrafo único. Em uma perspectiva colaborativa, o Conselho de Educação Estadual poderá compartilhar ou delegar funções ao Conselho de Educação Escolar Indígena e Conselhos Municipais de Educação, podendo ser criados por ato do executivo ou por delegação do próprio Conselho de Educação em cada realidade.
Seção II
Dos territórios etnoeducacionais
Art. 26. O Território Etnoeducacional Cone Sul deve se constituir nos espaços institucionais em que os entes cooperados, as comunidades indígenas, as organizações indígenas e indigenistas e as instituições de ensino superior pactuarão as ações de promoção da Educação Escolar Indígena efetivamente adequada às realidades sociais, históricas, culturais e ambientais dos grupos e comunidades indígenas.
§ 1o O Território Etnoeducacional Cone Sul objetivam promover o regime de colaboração para promoção e gestão da Educação Escolar Indígena, definindo as competências comuns e privativas da União, Estado de Mato Grosso do Sul e Municípios aprimorando os processos de gestão e de financiamento da Educação Escolar Indígena e garantindo a participação efetiva das comunidades indígenas interessadas.
§ 2o Para a implementação do Território Etnoeducacional Cone Sul devem ser criados ou adaptados mecanismos jurídico-administrativos que permitam a sua constituição em unidades executoras com dotação orçamentária própria, tais como os consórcios públicos e os arranjos de desenvolvimento educacionais.
§ 3o O Território Etnoeducacional Cone Sul estão ligados a um modelo de gestão das políticas educacionais indígenas pautados pelas ideias de territorialidade, protagonismo indígena, interculturalidade na promoção do diálogo entre povos indígenas, sistemas de ensino e demais instituições envolvidas, bem como pelo aperfeiçoamento do regime de colaboração.
§ 4o A comissão gestora do Território Etnoeducacional Cone Sul é responsável pela elaboração, pactuação, execução, acompanhamento e avaliação dos planos de ação definidos nos respectivos territórios.
TÍTULO VI
DAS DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 27. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.
CAMPO GRANDE-MS, 27 de abril de 2015.
MARIA CECILIA AMENDOLA DA MOTTA
Secretária de Estado de Educação
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