Senhor Presidente,
Nos termos do § 1º do art. 70 e do inciso VIII do art. 89, ambos da Constituição Estadual, comunico a essa augusta Assembleia Legislativa, por intermédio de Vossa Excelência, que decidi vetar, totalmente, o Projeto de Lei que Proíbe a participação de pessoas que tenham sido condenadas pela Lei Federal nº 11.340, de 07 de Agosto de 2006, em programas habitacionais e sociais de responsabilidade do Governo do Estado de Mato Grosso do Sul, pelas razões que, respeitosamente, peço vênia para expor:RAZÕES DO VETO:
Pretendeu o ilustre Deputado Marçal Filho, autor do Projeto de Lei, proibir a participação em Programas Habitacionais e Sociais de responsabilidade do Governo do Estado de Mato Grosso do Sul de pessoas que tenham sido condenadas pela Lei Federal nº 11.340, de 7 de agosto de 2006, conhecida como Lei Maria da Penha. Embora o tema seja louvável, a proposição deverá ser vetada pelos motivos justificados a seguir.
Inicialmente, sob o aspecto formal, infere-se que, ao estabelecer regras para participação em programas habitacionais e sociais de responsabilidade do Estado, acaba o Poder Legislativo por dispor sobre atribuições de órgãos públicos Estaduais, providências essas que constituem ato típico de Administração, matéria afeta à iniciativa exclusiva do Chefe do Poder Executivo Estadual, o que se caracteriza em flagrante ofensa ao princípio da harmonia e independência dos Poderes, insculpido no art. 2º da Constituição Estadual.
Com efeito, inserem-se na iniciativa do Governador do Estado as leis que disponham sobre a criação, a estrutura e as atribuições das Secretarias e dos órgãos da Administração Pública (art. 67, § 1º, inciso II, alínea “d”, CE), bem como a ele compete, privativamente, exercer, com o auxílio dos Secretários do Estado, a direção superior da administração estadual e dispor sobre a estrutura, atribuições e funcionamento de seus órgãos (art. 89, incisos V e IX, CE).
Em âmbito estadual, a Lei nº 4.640, de 24 de dezembro de 2014, que dispõe sobre a estrutura básica do Poder Executivo, atribui à Secretaria de Estado de Infraestrutura (SEINFRA), em conjunto com a Agência de Habitação Popular de Mato Grosso do Sul (AGEHAB), a competência para “a formulação da política habitacional do Estado e a definição das diretrizes” (art. 25, inciso XVII). Estabelece, ainda, a competência da Secretaria de Estado de Direitos Humanos, Assistência Social e Trabalho (SEDHAST) para “a gestão da política estadual de assistência social em Mato Grosso do Sul” (art. 21, inciso VI).
A Constituição Estadual, ao tratar sobre habitação, estabelece ao Conselho Estadual da Habitação – que corresponde ao atual Conselho Estadual das Cidades, criado pela Lei Estadual nº 2.940, de 16 de dezembro de 2004, órgão integrante da SEINFRA/MS – a competência para estabelecer as diretrizes para a política estadual de habitação (art. 221, CE).
Ademais, no que se refere aos programas habitacionais do Estado de Mato Grosso do Sul, realizados, exclusivamente, com aporte financeiro do próprio Estado, os critérios de seleção de beneficiários estão estabelecidos na Lei Estadual nº 4.617, de 22 de dezembro de 2014. Já quanto aos programas habitacionais implementados em parceria com o Governo Federal, estes devem obedecer às regras estabelecidas pela União, especialmente, quanto aos critérios de seleção dos beneficiários (Lei Federal nº 11.977/2009), não cabendo ao Estado estabelecer regramento diverso, sob pena de afronta à competência da União para estabelecer diretrizes voltadas ao desenvolvimento habitacional (art. 21, inciso XX, CF).
Ainda sob o aspecto formal, na proposta legislativa, ao pretender proibir a participação de pessoas condenadas pela Lei Federal nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha), o Parlamentar acaba por instituir, de maneira implícita, uma pena acessória ao infrator/condenado, invadindo competência privativa da União, para legislar sobre direito penal, nos termos do art. 22, inciso I, da CF.
Não bastassem as inconstitucionalidades de natureza formal, a proposta legislativa também deve ser vetada por razões de natureza material.
Os programas habitacionais, de modo geral, foram instituídos com o objetivo de atender parcela da população menos favorecida, tendo os critérios de admissão de beneficiários disciplinados em lei, conforme diretrizes estabelecidas pela União e demais entes federativos.
No âmbito estadual, a Lei nº 4.617, de 22 de dezembro de 2014, estabelece que os programas habitacionais realizados com recursos, exclusivamente, do Poder Executivo Estadual deverão levar em consideração: cotas para minorias; famílias que vivem em área de risco, insalubres ou perigosas; famílias em situação de vulnerabilidade e risco envolvendo crianças, adolescentes e idosos; famílias com menor renda familiar; e as que já estejam cadastradas em programas sociais do Governo (art. 3º, parágrafo único).
Nota-se que os critérios estabelecidos para acesso aos programas habitacionais do Estado já buscam conceder proteção especial às famílias em situação de vulnerabilidade e risco, nas quais se entende incluídas – ainda que implicitamente – as mulheres vítimas de violência doméstica.
Por fim, o presente veto não impede a instituição de instrumentos administrativos pelo Poder Executivo, por intermédio da Subsecretaria de Políticas Públicas para Mulheres e da Secretaria de Estado de Direitos Humanos, Assistência Social e Trabalho, no intuito de coibir a violência contra as mulheres, alcançando assim o objetivo da proposta legislativa.
Registra-se, portanto, que a Proposta de Lei em tela deve ser vetada, totalmente, por contrariar os arts. 21, inciso XX; e 22, inciso I, da Constituição Federal, e os arts. 2º, caput; 67, § 1º, inciso II, alínea “d”; 89, incisos V e IX e 221, todos da Constituição Estadual.
À vista do exposto, não me resta alternativa senão a de adotar a rígida medida do veto total, contando com a compreensão e a imprescindível aquiescência dos Senhores Deputados para sua manutenção.
Atenciosamente,
REINALDO AZAMBUJA SILVA
Governador do Estado
A Sua Excelência o Senhor
Deputado PAULO JOSÉ ARAÚJO CORREA
Presidente da Assembleia Legislativa
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