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ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL


MENSAGEM GABGOV/MS Nº 1, DE 3 DE JANEIRO DE 2018.

Veto Parcial: Altera a ementa e o art. 2º e acrescenta o inciso VI, e o parágrafo único ao art. 3º, da Lei Estadual nº 3272, de 9 de outubro de 2006.

Publicada no Diário Oficial nº 9.566, de 4 de janeiro de 2018, páginas 2 e 3.
REF: Lei nº 5.155, de 3 de janeiro de 2018.

Senhor Presidente,

Nos termos do § 1º do art. 70 e do inciso VIII do art. 89, ambos da Constituição Estadual, comunico a essa augusta Assembleia Legislativa, por intermédio de Vossa Excelência, que decidi vetar, parcialmente, o Projeto de Lei de autoria do Deputado Pedro Kemp, que “Altera a ementa e o art. 2º e acrescenta o inciso VI, e o parágrafo único ao art. 3º, da Lei Estadual nº 3272, de 9 de outubro de 2006”, pelas razões que, respeitosamente, peço vênia para expor:

RAZÕES DO VETO:

Analisando o autógrafo do projeto de lei, de autoria do Deputado Estadual Pedro Kemp, que altera a ementa e o art. 2º e acrescenta o inciso VI, e o parágrafo único ao art. 3º, da Lei Estadual nº 3272, de 9 de outubro de 2006, com a preocupação de respeitar o ordenamento jurídico e resguardar o interesse público, entendi por bem vetar o art. 3º, abaixo descrito:

Art. 3º O art. 3º da Lei Estadual nº 3.272, de 9 de outubro de 2006, passa a vigorar acrescido do inciso VI e do parágrafo único, com as seguintes redações:

“Art. 3º .....................................:

.....................................................

VI - serviços bancários.

Parágrafo único. O fornecedor de produto ou serviço bancário, bem como o relativo a cartão de crédito, também deverá disponibilizar o cancelamento dos contratos em vigor por meio de caixa eletrônico.” (NR)

Em que pese o nobre interesse envolvido no projeto de lei, é iniludível que a norma, nesse sentido, veiculada no art. 3º do Projeto de Lei padece de vício de inconstitucionalidade formal, notadamente porque excursiona sobre matérias de competência privativa da União.

Não obstante o Código de Código de Defesa do Consumidor estabeleça regras de proteção ao consumidor, que se aplicam aos contratos relativos às relações de consumo, os serviços bancários são regidos por normas específicas, editadas pela União, ente competente para estabelecer normas gerais acerca do direito financeiro (art. 24, I, §1º, CF).

Ainda, no que se refere aos “serviços bancários”, a União, no âmbito de sua competência para editar normas gerais sobre direito financeiro (art. 24, I, §1º, CF), editou a Lei nº 4.595/1964 que dispõe sobre a política e as instituições monetárias, bancárias e creditícias, instituindo o Sistema Financeiro Nacional, composto pelo Banco Central do Brasil (art. 1º, II), autarquia federal competente para expedir normas em cumprimento às disposições que lhe são atribuídas (art. 9º).

Assim, o Banco Central do Brasil, no uso de suas atribuições, expediu a Resolução BACEN nº 3.694, de 26 de maço de 2.009, que trata sobre a prevenção de riscos na contratação de operações e na prestação de serviços por parte de instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil. Acerca do cancelamento dos referidos serviços assim dispõe:

“Art. 1º As instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil, na contratação de operações e na prestação de serviços, devem assegurar:
[...]
II - a integridade, a confiabilidade, a segurança e o sigilo das transações realizadas, bem como a legitimidade das operações contratadas e dos serviços prestados;
III - a prestação das informações necessárias à livre escolha e à tomada de decisões por parte de clientes e usuários, explicitando, inclusive, direitos e deveres, responsabilidades, custos ou ônus, penalidades e eventuais riscos existentes na execução de operações e na prestação de serviços;
[...]
VI - a possibilidade de tempestivo cancelamento de contratos”

“Art. 3º. É vedado às instituições referidas no art. 1º recusar ou dificultar, aos clientes e usuários de seus produtos e serviços, o acesso aos canais de atendimento convencionais, inclusive guichês de caixa, mesmo na hipótese de oferecer atendimento alternativo ou eletrônico.
§ 1º O disposto no caput não se aplica às dependências exclusivamente eletrônicas nem à prestação de serviços de cobrança e de recebimento decorrentes de contratos ou convênios que prevejam canais de atendimento exclusivamente eletrônicos.
§ 2º A opção pela prestação de serviços por meios alternativos aos convencionais é admitida desde que adotadas as medidas necessárias para preservar a integridade, a confiabilidade, a segurança e o sigilo das transações realizadas, assim como a legitimidade dos serviços prestados, em face dos direitos dos clientes e dos usuários, devendo as instituições informá-los dos riscos existentes.
§ 3º As instituições devem divulgar, em suas dependências e nas dependências dos estabelecimentos onde seus produtos são ofertados, em local visível e em formato legível, informações relativas às situações que impossibilitem a realização de pagamentos ou de recebimentos nos canais de atendimento existentes, a exemplo dos contratos ou convênios que prevejam canais de atendimento exclusivamente eletrônicos, dos boletos de pagamento vencidos ou fora do padrão, bem como dos pagamentos com cheque.”

Depreende-se dos dispositivos acima que é permitido às instituições financeiras disponibilizar serviços diversos de forma convencional, alternativa ou eletrônica. Porém, em qualquer dos meios de prestação de serviços - seja convencional, alternativo ou eletrônico -, deve-se assegurar a integridade, a confiabilidade, a segurança e o sigilo das transações realizadas, bem como a legitimidade das operações contratadas e dos serviços prestados, assegurando ainda a possibilidade de cancelamento (art. 1º, II e VI). Nota-se ainda que o acesso aos canais alternativos e eletrônicos, disponibilizados pelas instituições financeiras, configura-se como opção do usuário (art. 3º, §2º).

A normatização contida no Projeto de Lei visa a estender as formas de cancelamento de serviços continuados, previstas na Lei Estadual nº 3.272/2006, aos serviços bancários. No entanto, a prestação dos serviços bancários, de forma geral, segue normatização expedida pela União, responsável pelo estabelecimento de normas gerais (art. 24, § 1º, CF) e, não obstante os Estados e o DF tenham competência suplementar (art. 24, § 2º, CF), o assunto já encontra disciplinado pelo Banco Central do Brasil, com aplicação uniforme em todo território nacional (Lei nº 4.595/1964 e Resolução BACEN nº 3.694/2009).

De acordo com a Constituição Federal, ainda que existente a lei federal contendo normas gerais (art. 24, § 1º), poderão os Estados e o DF, no uso da competência suplementar, preencher os vazios da lei federal de normas gerais, a fim de afeiçoá-la às especificidades locais.

Assim sendo, ainda que se admitisse versar a proposição sobre temas afetos ao condomínio legislativo dos entes federados, a competência reservada aos Estados-membros, se existente leis federais tratando do tema - como acima demonstrado há -, é residual, encontrando-se adstrita à edição de normas suplementares (art. 24, § 2º).

Da análise do Projeto de Lei em tela, no que se refere ao art. 3º (inciso e parágrafo único objeto de acréscimos), resulta evidente que a matéria versada não se fundamenta em nenhuma especificidade local do Estado de Mato Grosso do Sul, sendo certo que a merece tratamento uniforme em todo o território nacional, porquanto afeta indistintamente a todos entes políticos da Federação, e já se encontra disciplinada pelos atos normativos federais acima transcritos que contêm normas gerais.

Por outra vertente, ainda que entendesse como sendo da competência do Estado, a implantação da medida anunciada no autógrafo, demandaria fiscalização no cumprimento dos seus comandos (questões orçamentárias e contratuais), tudo a cargo de órgão estadual do Poder Executivo, o que tornaria a medida inconstitucional, por afronta à iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo.

Com efeito, nos termos dos arts. 67, § 1º, inciso II, alínea “d”, e 89, incisos V e IX, da Constituição Estadual, é da competência do Chefe do Executivo a iniciativa das leis que impliquem na organização dos serviços públicos, a quem cabe exercer a “direção superior da Administração estadual” com o auxílio dos Secretários de Estado.

Nessa linha de raciocínio, insta salientar que a aprovação de leis que imponham ao Chefe do Executivo um dever relacionado à adoção de uma política pública ou de uma medida administrativa originariamente planejada pelo Parlamento, acaba por interferir em suas prerrogativas inerentes de Chefe da Administração e, ipso facto, representa flagrante ofensa ao princípio da harmonia e independência dos Poderes, esculpido no artigo 2º, caput, da Carta Magna, reproduzido pela Constituição Estadual (art. 2º, caput).

Infere-se, portanto, que as alterações ao art. 3º da Lei nº 3.272/2006 propostas pelo projeto padecem de vício de inconstitucionalidade formal seja porque excursionam sobre matéria cuja competência legislativa para normas gerais é da União, seja porque pressupõem o aparelhamento da Administração Pública, por meio de seus servidores e órgãos, para execução e fiscalização de política pública instituída pelo Parlamento, evidenciando afronta à competência do Chefe do Poder Executivo (arts. 2º; 67, § 1º, inciso II, alínea “d”; e 89, incisos V e IX, da Constituição Estadual).

À vista do exposto, ressalta-se que a referida Proposta de Lei deve ser vetada, parcialmente, em relação ao art. 3º, por contrariedade ao art. 24, incisos I, V, VIII , §§ 1º a 3º da Constituição Federal e aos arts. 2º, caput; 67, §1º, inciso II, alíneas “d”; 89, incisos V e IX, todos da Constituição Estadual.

Assim, não me resta alternativa senão a de adotar a dura medida do veto parcial, contando com a compreensão e a imprescindível aquiescência dos Senhores Deputados para sua manutenção.

Atenciosamente,

REINALDO AZAMBUJA SILVA
Governador do Estado

A Sua Excelência o Senhor
Deputado OSWALDO MOCHI JUNIOR
Presidente da Assembleia Legislativa
CAMPO GRANDE-MS