Senhor Presidente,
Nos termos do § 1º do art. 70 e do inciso VIII do art. 89, ambos da Constituição Estadual, comunico a essa augusta Assembléia Legislativa, por intermédio de Vossa Excelência, que decidi vetar totalmente o projeto de lei que Estabelece normas para a exploração de recursos pesqueiros no Estado de Mato Grosso do Sul e dá outras providências, pelas razões que, respeitosamente, peço vênia para passar a expor:
RAZÕES DO VETO:
Analisando o autógrafo do projeto de lei aprovado pelos doutos Deputados Estaduais, com a preocupação de respeitar a ordem jurídica e resguardar o interesse público, entendi por bem adotar a medida extrema do veto total, porquanto o texto sub examine afronta a alínea “d” do inciso II do § 1º do art. 67; os incisos V e VI do art. 89, o parágrafo único do art. 93 da Constituição Estadual; fere os arts. 1º, 2º e 8º da Lei nº 2.256, de 9 de julho de 2001, o inciso I do art. 18 da Lei nº 2.152, de 26 outubro de 2000, não guarda consonância com a Lei nº 1.826, de 12 de janeiro de 1998 e, conseqüentemente, o Decreto nº 11.724, de 5 de novembro de 2004; viola a Resolução CONAMA 237/97 e o art. 10 da Lei Federal nº 6.938, de 31 de agosto de 1981 e, ainda, é contrário ao interesse público, conforme ao final restará satisfatoriamente demonstrado.
Pretendeu o nobre Deputado autor do projeto de lei estabelecer normas para a exploração de recursos pesqueiros no Estado.
Não obstante a justificativa da necessidade de compatibilização das normas estaduais vigentes com a realidade atual dos pescadores que exercem a atividade inofensivamente ao meio ambiente, tal entendimento deve ser visto com reservas.
Preliminarmente, no que tange ao aspecto jurídico, não pode o texto encontrar abrigo no ordenamento jurídico do Estado, porquanto vulnera flagrantemente os incisos V e VI do art. 89 e o parágrafo único do art. 93 da Constituição Estadual.
Vê-se, desde logo, que o projeto de lei peca por afastar da iniciativa do Governador a condução da política pública de proteção ambiental desenvolvida pelo Estado, com o que torna letra morta os sobreditos dispositivos constitucionais.
Desse modo, forçoso reconhecer o vício de incompetência em que incorre a proposta, posto que o impulso inicial ao processo legislativo sub examine, é reservado ao Chefe do Poder Executivo, que é a autoridade que exerce, com o auxílio dos Secretários de Estado, o comando da administração pública sul-mato-grossense, formulando políticas públicas a serem implementadas no Estado, o que acarreta a inconstitucionalidade daquela proposição, por ofensa ao princípio da independência e harmonia dos Poderes inserto no art. 2º da Constituição Estadual, bem como na Carta Federal.
Fortalecendo a tese da competência inata do Poder Executivo para a formulação das políticas públicas de preservação do meio ambiente, prescreve o art. 226 da Constituição Estadual, que dispõe que o órgão de deliberação e formulação de políticas estadual de proteção ao meio ambiente é o Conselho Estadual de Controle Ambiental, cuja composição e regulamentação se fará por lei (alterado pela Emenda Constitucional nº 3, de 22/6/95- DOMS, de 28/6/95).
Ora, o Conselho Estadual de Controle Ambiental - CECA é um órgão integrante da estrutura do Poder Executivo, ao qual cabe o estabelecimento de diretrizes políticas para a utilização dos recursos naturais do Estado, nos termos do que dispõem os arts. 1º e 2º da Lei nº 2.256, de 9 de julho de 2001.
Corroborando a natureza executiva desse Conselho, o art. 3º desse diploma legal arrola que o seu Presidente será o Secretário de Estado de Meio Ambiente e Recursos Hídricos.
Um pouco mais à frente, para espancar qualquer dúvida sobre a natureza desse Conselho, o art. 8º da Lei nº 2.256, de 2001, estatui que as competências, os encargos e as normas de funcionamento dos órgãos que o compõem serão definidos em Regimento Interno aprovado pelo Chefe do Executivo.
E, por fim, para pôr cobro a qualquer discussão sobre qual o Poder competente para formular e executar a política de proteção ambiental, orientando e fiscalizando a utilização dos recursos naturais do Estado de Mato Grosso do Sul, impende registrar o que apregoa o inciso I do art. 18 da Lei nº 2.152, de 26 de outubro de 2000, que dispõe sobre a reorganização da estrutura básica do Poder Executivo do Estado, in verbis:
Art. 18 Compete à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos Hídricos:
I - a proposição e a gestão da política de proteção do meio ambiente, visando à compatibilização do desenvolvimento econômico e social com a preservação da sua qualidade e do equilíbrio ecológico, garantindo a participação da comunidade em sua execução.
(...)
Diante disso, seja qual for o ângulo sob o qual se analise a questão, percebe-se que a condução das políticas públicas de proteção ao meio ambiente está afetada ao Poder Executivo, razão pela qual não há outra conclusão possível senão a de que o ordenamento jurídico a ele reserva a iniciativa das leis que versem sobre a matéria.
Outrossim, a proposição padece de vício de iniciativa, uma vez que legisla sobre atribuição da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos Hídricos - SEMA e do Instituto de Meio Ambiente-Pantanal IMAP entre outros, infringindo assim, a alínea “d” do inciso II do § 1º do art. 67 da Constituição Estadual, que prescreve que compete ao Governador iniciar processo legislativo que disponha sobre atribuições de Secretarias de Estado ou órgãos da administração pública.
Assevera a jurisprudência sobre a inconstitucionalidade formal na criação da lei:
“O desrespeito à prerrogativa de iniciar o processo de positivação do Direito, gerado pela usurpação do poder sujeito à cláusula de reserva, traduz vício jurídico de gravidade inquestionável, cuja ocorrência reflete típica hipótese de inconstitucionalidade formal, apta a infirmar, de modo irremissível, a própria integridade do ato legislativo eventualmente editado.” STF-Pleno- Adin Pnº 1.391-2/SP- Rel. Min. Celso de Mello, Diário da Justiça, Seção I, 28.11.1997, p. 62.216.
Como se percebe, trata-se de indiscutível inconstitucionalidade formal e por esse sério e intransponível vício, não pode o projeto de lei encontrar abrigo no ordenamento jurídico do Estado.
Por outro lado, no que diz respeito ao mérito do projeto de lei, verifica-se que a garantia da sustentabilidade dos recursos e liberação da utilização de petrechos proibidos pela legislação ambiental em vigor, afronta as políticas até então adotadas pelo Governo Estadual.
Não se pode falar em sustentabilidade se o marco geral do projeto em análise aponta para o livre acesso, o que é totalmente contrário às políticas que vêm sendo adotadas por este Governo. A visão da conservação, que este Governo aponta, surgiu em contraposição aos efeitos deletérios causados pelo livre acesso, e tem como fundamento básico o conceito de captura sustentável, assim entendida como aquele nível de captura total mensal ou por pescaria, que pode ser obtido indefinidamente sem que cause depleção no estoque capturado. Cabe aos técnicos definir qual o esforço de captura suportável nos diferentes rios deste Estado e este papel vem sendo cumprido à risca pelos técnicos da SEMA/IMAP.
Com a implantação de uma sólida política de ordenamento para o setor pesqueiro, em consonância com os preceitos dispostos nas legislações federal e estadual que considera tanto os impactos diretos e indiretos sobre os recursos pesqueiros, bem como as condicionantes ecológicas, econômicas e sociais, incumbe à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos Hídricos a defesa dos interesses difusos, que corresponde àqueles do interesse de toda a coletividade e não de um grupo específico de usuários dos recursos naturais, conforme explicitado no art. 225 da Constituição Federal.
Ademais, a matéria abordada pelo projeto em epígrafe já foi objeto de lei anterior que abarcou todos os detalhes e pormenores relativos à atividade pesqueira no Estado, sendo portanto, desnecessário uma nova lei tratando do mesmo assunto. Se fosse o caso, bastaria alterar a anterior, isto é, a Lei nº 1.826, de 12 de janeiro de 1998, melhorando-a ou revogando-a.
Passamos a análise detalhada do projeto.
A redação dada ao art. 2º do projeto é totalmente inconveniente e inoportuno, posto que abre permissivo para que os pescadores que não tenham a pesca como seu único meio de vida possam exercer essa atividade profissional, contrariando, assim, a legislação estadual, na forma do previsto no Decreto nº 11.724, de 5 de novembro de 2004, que regulamentou a Lei nº 1.826, de 12 de janeiro de 1998. No caso, o mais recomendado é que o Estado mantenha a legislação mais restritiva para que não haja risco de se contrariar a legislação federal.
A parte final do art. 2º dispõe que a pesca comercial poderá ser exercida pelo pescador profissional autorizado pelo Instituto de Meio Ambiente Pantanal IMAP ou que esteja cadastrado no órgão federal competente. Ocorre que a Resolução CONAMA 237/97 é clara ao estabelecer os critérios para o exercício da competência do licenciamento ambiental em nível federal, estadual e municipal, a que alude o art. 10 da Lei de Política Nacional de Meio Ambiente nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Com efeito, o art. 2º da Resolução dispõe que a atividade pesqueira, como utilizadora de recursos naturais, dependerá de prévio licenciamento do órgão ambiental competente, e o art. 5º assevera que compete ao órgão ambiental do Estado, como integrante do SISNAMA, o licenciamento de atividades utilizadoras de recursos naturais, dentre as quais a pesca profissional.
Entre os órgãos ontologicamente responsáveis pela proteção e melhoria da qualidade ambiental, integrantes do SISNAMA, não consta a Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca (SEAP/PR) do Governo Federal, de modo que as licenças, permissões e autorizações para o exercício da pesca profissional e da aqüicultura nas áreas de pesca do Território Nacional, previstas atualmente no art. 23, § 1º da Lei Federal nº 10.683, de 2003, não possuem a natureza jurídica de licenças, permissões ou autorizações ambientais.
Do ponto de vista técnico, para que as novas medidas de ordenamento pesqueiro possam ser implementadas, tais como o Zoneamento de Pesca, já previsto na Lei nº 1.826, de 1998, os Acordos de Pesca postulados pelo Governo Federal, o uso de petrechos de pesca reivindicados pelos pescadores, análise da capacidade de suporte e o esforço de captura de nossos rios, tem-se a necessidade de se conhecer o real número dos usuários do sistema (pescadores profissionais) em nosso Estado.
Para equacionar esta questão, deve-se observar as discrepâncias dos cadastros de pescadores dos Governos Federal e Estadual. O cadastro de pescadores profissionais, mantido pela Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca do Governo Federal, em dezembro de 2005, apontava o número de 4.995 pescadores registrados. O cadastro de pescadores profissionais, mantido pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos Hídricos tinha no mesmo período, 3.013 pescadores cadastrados. Entretanto, naquele período havia 3.895 supostos pescadores atuando irregularmente em Mato Grosso do Sul, de posse unicamente da Carteira Profissional expedida pela SEAP.
A partir da edição do Decreto nº 11.808, de 3 de março de 2005, foram verificados os CPF de 3.013 pescadores cadastrados no Registro Geral de Pesca/SEMA/IMAP, cruzando as informações em 65 bases de dados. Posteriormente, com o trabalho exaustivo de 260 policiais (civis e militares) e apoio do Exército Brasileiro (Comando Militar do Oeste), verificou-se in loco, em todos os municípios deste Estado, a veracidade das informações cadastrais.
De posse das informações foi publicada a relação dos cadastros regulares por município (Decreto nº 11.963, de 3 de novembro de 2005). Neste decreto foi dado o direito dos excluídos requererem a revisão de sua exclusão do cadastro. A Comissão de Avaliação dos pedidos de revisão (Resolução “P” SEMA nº 007, de 20 de fevereiro de 2006), dentro do prazo estipulado, concluiu a avaliação dos recursos impetrados pelos pescadores, observando a legislação em vigor e as informações cadastrais disponíveis.
Assim, os dados obtidos apontaram que dos 3.013 cadastros de pescadores/2005 foram excluídos 1.742 cadastros, por não atenderem às exigências legais para serem portadores da Autorização Ambiental expedida pela SEMA/IMAP. Dos 220 pescadores que solicitaram a revisão da sua exclusão do Cadastro SEMA/IMAP, 142 foram indeferidos, 6 deferidos e 72 apresentam pendências documentais. Concluiu-se, assim, que 1.343 pescadores profissionais estão regulares e aptos a portarem a nova Autorização Ambiental e a exercerem a atividade profissional em nosso Estado, devidamente licenciado, dentro dos quesitos da lei.
Cabe ressaltar que o órgão federal (SEAP) já foi notificado das irregularidades detectadas no cadastro dos pescadores que atuam neste Estado e que são portadores da carteira de pescador profissional federal. O Departamento de Polícia Federal, por meio da Superintendência Regional em Mato Grosso do Sul, a fim de instruir investigações que estão sendo feitas com o intuito de apurar o possível cometimento de crimes de estelionato (art. 171, parágrafo 3º. do CPB), que estaria ocorrendo por meio de recebimento indevido de seguro desemprego, por parte de falsos pescadores, durante o período de defeso da pesca em Mato Grosso do Sul, solicitou, administrativamente, todos os documentos cadastrais daqueles pescadores que foram excluídos do Registro Geral de Pesca da SEMA/IMAP. O mesmo procedimento foi adotado pelo Ministério Público Federal e Estadual, que estão apurando o possível cometimento de crimes de estelionato e formação de quadrilha.
O aumento do número de usuários no sistema, como se pretende, é uma das causas da sobrepesca no Estado. Os dados científicos da produção pesqueira, analisados nos últimos 26 anos, apontam uma sobrepesca de recrutamento (exploração predatória de peixes adultos desovantes) e sobrepesca de crescimento (exploração predatória de peixes jovens e pré-adultos) no Pantanal. Aumentar o esforço de captura (maior número de usuários) levará ao caos a atividade e a um estressamento ambiental sem precedentes.
Quando estabelece o limite de captura e de transporte de pescado de 400 kg/mês pelos pescadores profissionais, o projeto dispõe sobre matéria já regulada pela legislação ambiental estadual, porquanto esse limite já é o previsto no art. 1º do Decreto nº 11.987, de 28 de novembro de 2005.
Tecnicamente, é impossível saber qual o verdadeiro esforço de captura sobre os estoques pesqueiros quando não se dispõe de estatísticas de desembarque. A definição de cotas, a exemplo como ocorre no Estado de Mato Grosso, busca estabelecer parâmetros de sustentabilidade e gerar informações para melhor gestão deste recurso, visando a implantar o controle de desembarque no Estado que, além das informações dos estoques, também possibilitará o controle sanitário e fiscal desta atividade, e com isso coíbe-se a comercialização clandestina e a pesca predatória nos rios, oferecendo ao consumidor procedência e qualidade do produto.
O art. 4º é inadequado, uma vez que as cotas anuais são definidas por uma negociação ampla e homologadas pelo Conselho Estadual de Pesca - CONPESCA, observando o regimento interno, pois a sua validação é definida no ano anterior à sua implantação.
Igualmente os §§ 1º e 2º do sobredito artigo são impróprios, posto que cabe ao Poder Executivo a deliberação de medidas e não ao Conselho. Além disso, a composição do Conselho está definida no Decreto nº 9.627, de 10 de setembro de 1999, Capítulo III, art. 3º. Considero que não compete ao Legislativo fazer alterações no regimento interno porque transgride a disposição do art. 19, capítulo IV, do regimento interno do CONPESCA.
É imperioso destacar que o Conselho Estadual de Pesca busca a harmonização dos interesses de todos os usuários do sistema, bem como da sociedade em geral, pois trata a matéria de um bem coletivo e de interesse difuso, não sendo adequada uma composição paritária.
No § 3º do art. 7º consta a expressão devidamente registrados no órgão federal competente. Trata-se, novamente, de invalidar a obrigatoriedade da Autorização Ambiental do Estado para o exercício profissional. A ingerência do Poder Legislativo fere o princípio da autonomia administrativa, vulnerando gravemente a regra contida no art. 2º da Constituição Federal e seu correspondente, art. 2º da Constituição Estadual.
Por outro norte, o art. 10 prescreve que a autorização não poderá ser suspensa por prazo indeterminado aos pescadores cadastrados perante o órgão federal. Ocorre que a suspensão é uma prerrogativa do órgão ambiental como ato discricionário. Novamente observa-se a intenção de invalidar a obrigatoriedade do porte da Autorização Ambiental do Estado para o exercício da atividade pesqueira.
A emissão de Autorização Ambiental para a pesca comercial foi suspensa pelo Decreto nº 10.634, de 24 de janeiro de 2002, ora já revogado, subsidiada pelo estudo “Avaliação do Nível de Exploração dos Estoques Pesqueiros” desenvolvido pelo Serviço Estadual de Controle da Pesca e Aqüicultura - SECPESCA, a partir dos dados da EMBRAPA Pantanal, que sinalizaram tendência de sobrepesca do pacu e do jaú, e aprovado pelo CONPESCA. Na oportunidade, foi apontado como agravante o grande número de solicitações de Autorização Ambiental às vésperas do início do período de defeso 2001/2002, coincidindo com o período no qual são concedidos pelo Poder Público Estadual benefícios sociais aos pescadores profissionais. Concomitantemente, técnicos do Instituto de Meio Ambiente-Pantanal, após vistoria in loco, constataram a inexatidão das declarações prestadas pelos titulares de Autorização Ambiental.
A pesca é uma atividade econômica extrativista de recursos naturais renováveis, que ao seu turno, são aqueles que podem ser mantidos à perpetuidade, em regime de sustentação, ou seja, num regime que satisfaça as necessidades presentes sem comprometer a possibilidade de as futuras gerações proverem suas próprias necessidades. A proteção do meio ambiente implica a defesa de um direito fundamental e esta tem sido a chave para a interpretação do papel do Estado na limitação do exercício de direitos quando presentes temas ambientais. Tratando-se de proteção de direito fundamental, impõe-se a interpretação das normas que regulam o exercício da função ambiental do Estado segundo um princípio de máxima efetividade ante os bens jurídicos que protege, ou seja, atribuindo-se à norma constitucional o sentido que maior eficácia lhe dê.
A proposição afronta o Poder Público, que no exercício da função ambiental que lhe é cometida de forma expressa pelo caput do art. 225 da Constituição Federal, de 1988, exercer o controle da ordem econômica. Entender a atividade estatal como função significa condicionar o seu exercício (poder) a uma finalidade (dever), no caso, o dever de defender e preservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado para as presentes e futuras gerações, tarefa que perpassa necessariamente pela utilização sustentável dos recursos naturais.
O art. 12 é na íntegra, ilegal, inconveniente e inoportuno, uma vez que o art. 24 da Constituição Federal estatui que compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente, inclusive sobre a pesca. Ou seja, compete ao Estado fazer um detalhamento maior para atender a suas peculiaridades podendo criar regras mais restritivas, como é o caso da proibição do uso de anzol de galho, bóia fixa e outros equipamentos.
Trata-se de aparelhos fixos e a sua utilização está vetada por legislação federal, conforme o inciso I do art. 2º da Portaria nº 22-N, de 9 de março de 1993, que proíbe no âmbito de Mato Grosso do Sul, excluindo a Bacia do Rio Paraná, armadilhas tipo tapagem, pari, cercada ou quaisquer aparelho fixos. No entendimento do IBAMA o anzol de galho é um aparelho fixo (Ofício Nº 094/2005/GAB/IBAMA/MS de 4 de março de 2005). Assim, não procede o argumento apresentado na justificativa “que sejam estabelecidas medidas em conformidade com as restrições contidas na Portaria nº 22-N do IBAMA.”
A disciplina do parágrafo único do art. 12 é inadequada, posto que se trata de uma normatização e compete ao órgão ambiental definir os critérios de uso de equipamentos de pesca.
A expressão bem como estabelecer as Reservas Pesqueiras, contida na parte final do art. 13 é irregular. Ato tendencioso buscando estabelecer o Zoneamento Pesqueiro nos rios de Mato Grosso do Sul. O Zoneamento Pesqueiro só será possível quando estiverem disponíveis os “Estudos de Avaliação da Capacidade de Suporte dos rios de Mato Grosso do Sul” e a “Análise do Esforço de Captura das Populações Nativas de Mato Grosso do Sul”, o que não é o caso.
No art. 15 houve redução de 5 cm no tamanho mínimo de captura das seguintes espécies: jaú, pintado e dourado.
Os tamanhos mínimos de captura foram definidos no Decreto nº 12.039, de 8 de fevereiro de 2006 (tabela abaixo) a partir de uma série de dados, proveniente de estudos técnico-científicos, com a participação de pesquisadores e gestores de Mato Grosso do Sul (UFMS, UEMS, IBAMA, IMAP, SEMA UNIDERP) e de Mato Grosso (UEMT, UFMT, FEMA e instituições privadas) em reunião convocada pelo IBAMA, realizada em Cuiabá em abril de 2005. Estes tamanhos estão unificados entre os dois Estados e a Federação no pacto de harmonização das políticas e regras de ordenamento pesqueiro da Bacia do Alto Paraguai, do qual o Estado de Mato Grosso do Sul é signatário.
Nome Vulgar | Nome Científico | Tamanho Mínimo |
Jaú | Paulicea Iuetkeni | 95 cm |
Pintado | Pseudoplaystoma coruscans | 85 cm |
Cachara | Pseudoplaystoma fasciatum | 80 cm |
Dourado | Salminus maxilosus | 65 cm |
Pacu | Piractus mesopotamicus | 45 cm |
Curimbatá | Prochilodus lineatus | 38 cm |
Piau-uçu | Leporinus sp | 38 cm |
Barbado | Pinirampus pinirampu | 60 cm |
Piraputanga | Brycon microlepis | 30 cm |
Mediante essa decisão, submeteu-se a proposta ao CONPESCA em reunião no dia 31 de maio de 2005, que foi aprovada, apesar dos votos contrários da EMBRAPA Pantanal, dos Pescadores profissionais e da SEAP - Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca. A decisão foi publicada no Decreto nº 12.039, de 8 de fevereiro de 2006, com as medidas acima.
Não se pode anular os trabalhos científicos dos pesquisadores da UFMS, UEMS, UFMT, UEMT, IBAMA e instituições privadas e manter a sua hegemonia nas decisões das políticas de pesca do Pantanal. As reduções do tamanho mínimo de captura apresentadas no projeto de lei já foram defendidas pela Embrapa Pantanal, mas foi derrubada por se tratar de informações pontuais, de dados obtidos em apenas dois pontos de coleta: um no rio Miranda e outro no rio Paraguai. Os dados aprovados pelo CONPESCA são baseados em dados obtidos das pesquisas de 10 instituições e 12 pesquisadores que atuaram nos rios Miranda, Aquidauana, Negro, Paraguai, Dourados, Brilhante, Paraná, Sucuriú, Paranaíba, Coxim, Cuiabá e São Lourenço.
A ressalva apresentada no parágrafo único do art. 15, não tem fundamento algum, na medida em que as definições dos tamanhos mínimos são resultado das pesquisas realizadas que avaliam a atividade reprodutiva das populações de peixes nos rios e não um recurso para beneficiar a captura das espécies-alvo por pescadores amadores e profissionais.
O comprimento médio de início de primeira maturação (L50) corresponde àquele com o qual 50% dos indivíduos de uma população iniciam seu ciclo reprodutivo, ou seja, estão passando da fase jovem para a adulta. Esse valor de L50 é o tamanho mínimo de captura, para cada espécie que está sendo alterado, arbitrariamente, pelo projeto de lei, a fim de beneficiar o acesso dos pescadores profissionais aos estratos da população de peixes que ainda não entraram em sua atividade reprodutiva.
A alegação de que o estabelecimento desse parágrafo visa a vedar a captura de espécies em tamanhos superiores aos ali estabelecidos, faz-se necessária para que não se capture somente fêmeas daquelas espécies, bem como sejam estabelecidas medidas em conformidade com as restrições contidas na Portaria nº 22N, de 9 de março de 1993, do IBAMA contida na justificativa do projeto de lei, mas que não tem nenhuma fundamentação técnica plausível.
O art. 16 é impróprio, pois os projetos e programas que objetivem estimular a atividade da piscicultura em tanques e açudes já vem sendo desenvolvidos pela Cadeia Produtiva da Piscicultura a cargo da Secretaria de Estado da Produção e do Turismo, não sendo atribuição da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos Hídricos e nem do IMAP. Além disso, não cabe ao Poder Legislativo legislar sobre atribuição de órgão do Poder Executivo, conforme explanado inicialmente. Por esta razão, também o art. 17 queda-se eivado de inconstitucionalidade, posto que também cuida de estabelecer atribuição à SEMA.
Assim, por todos esses motivos expostos e, restando os demais artigos prejudicados, o referido projeto de lei não pode ingressar no ordenamento jurídico, por ser inconstitucional, ilegal, inconveniente, inoportuno, tecnicamente insustentável e contrário ao interesse público.
Por estas razões, amparado nas Manifestações da Procuradoria-Geral do Estado e da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos Hídricos, adoto a dura medida do veto total, contando com a compreensão e a imprescindível aquiescência dos nobres Senhores Deputados.
Em que pesem todos esses motivos que ensejaram as razões do veto, preocupado com a situação da pesca no Estado, bem como com os profissionais da pesca, no que tange à utilização de petrechos e aos limites de captura e transporte de pescado pelo pescador amador, este Governo, por intermédio da Secretária de Estado de Meio Ambiente e Recursos Hídricos, ouvido o CONPESCA, estudará a possibilidade de modificação de alguns regulamentos para o atendimento das reivindicações da classe.
Ao ensejo, renovo meus cumprimentos a Vossa Excelência e ilustres pares, reiterando a disposição deste Governo para assuntos de interesse social.
A Sua Excelência o Senhor
Deputado LONDRES MACHADO
Presidente da Assembléia Legislativa
CAMPO GRANDE - MS
Atenciosamente,
JOSÉ ORCÍRIO MIRANDA DOS SANTOS
Governador |